ABC | Volume 111, Nº5, Novembro 2018

Relato de Caso Izar et al Doença de Dercum e dislipidemia na infância Arq Bras Cardiol. 2018; 111(5):755-757 Omarcador de síntese de colesterol (latosterol) estava abaixo do nível de detecção, e as proporções beta‑sitosterol/colesterol e campesterol/colesterol foram de 115 e 149 µmol/mmol de colesterol (na faixa normal). Marcadores inflamatórios, como proteína C-reativa de alta sensibilidade (13,8 mg/L) e lipoproteína associada à fosfolipase A2 (Lp-PLA2, 375ng/ml), foram muito elevados. A criança não apresentou sinais de disfunção tireoidiana. Os hormônios sexuais e intermediários androstenediona (219 ng/mL), 17-hidroxiprogesterona (76 ng/dL), testosterona (124 ng/dL) e estradiol (24,10 pg/mL) foram altos para a idade. Sulfato de dehidroepiandrosterona (28,4 µg/dL) e hormônio do crescimento (0,67 ng/mL) estavam na faixa normal. Observou-se concentração normal da porção N-terminal do pró-hormônio do peptídeo natriurético do tipo B (NT‑proBNP), não refletindo disfunção miocárdica. A análise genética mostrou genótipo E3/E4 da apolipoproteína E e fator V Leiden -/-, não representando fatores de risco genéticos para doença cardiovascular. A composição corporal foi avaliada por bioimpedância elétrica (BIA 450, Biodynamics Inc, EUA), revelando níveis normais de água no corpo (23,1 L), mas alto constituinte de massa gorda (40%) para o sexo e a idade. O regime terapêutico adotado para a criança foi metformina 850 mg, atorvastatina 20 mg, losartan 25 mg, hidroclorotiazida 12,5 mg, gabapentina 300 mg três vezes ao dia, fentanil adesivo 12,5 mcg a cada 72 h, amitriptilina 50 mg à noite para redução da dor neuropática e morfina 10 mg em crises excepcionais de dor. Tanto quanto se sabe, este é o primeiro relato de um caso de doença de Dercum afetando uma criança pré-pubescente com lipomas na região dorsal, face e pescoço, parede abdominal, braços e pernas, que são locais comuns dos lipomas observados em pacientes com a doença de Dercum na idade adulta. 7 A presença de lipomas na coluna vertebral pode produzir uma compressão do plexo neural, causando dor extrema que se estende aos membros superiores e inferiores e à parte superior anterior do tronco, limitando, assim, a realização das atividades diárias normais. A criança apresenta uma forma rara da doença de Dercum ou lipomatose dolorosa com acometimento na infância. O diagnóstico da doença de Dercum foi baseado no diagnóstico diferencial com outras lipomatoses, conforme proposto recentemente por Hansson et al. 3 Seus pais e irmãos não apresentaram sinais de lipomatose ou lipomatose dolorosa , descartando o diagnóstico de lipomatose múltipla familiar, conforme descrito por Campen et al. 4 Além do acúmulo anormal de gordura, outros achados interessantes observados na paciente foram hiperinsulinemia, HDL-colesterol baixo, hiperbetalipoproteinemia, com predomínio de partículas de LDL pequenas e densas, caracterizando um estado de resistência à insulina. O mapa das HDLs revelou um fenótipo de partículas associadas ao aumento do risco cardiovascular, com baixa concentração de partículas de HDL-2, relacionadas à proteção cardiovascular, e alta concentração das partículas de HDL-3, com menor fator de proteção. 8 Essas mudanças no perfil de partículas de HDL podem ocorrer por fatores hereditários ou adquiridos, ou de forma secundária ao uso de drogas e exercícios aeróbicos vigorosos, como também na ingestão crônica de álcool. A predominância de partículas de LDL pequenas e densas está associada à progressão da aterosclerose e é frequente em indivíduos com múltiplos fatores de risco para doença cardiovascular, como diabetes, obesidade e outros estados de resistência à insulina. 9 Em pacientes com lipomatose, também foi descrita uma associação com atividade alterada da lipoproteína lipase (LPL) no tecido lipomatoso, afetando o metabolismo das partículas de HDL. 10 No entanto, os autores não consideram a atividade da LPL como o mecanismo mais aceitável para justificar as alterações nas subfrações de lipoproteínas observadas na doença de Dercum. O presente estudo não avaliou a atividade da LPL nesta paciente, e outros mecanismos podem ter afetado o remodelamento das subfrações de lipoproteínas. Figura 1 – Imagens de ressonância magnética obtidas A) no plano sagital (ponderadas em T1) e B) no plano axial (ponderadas em T2), evidenciando tecido adiposo subcutâneo difusamente proeminente, sem delineamento de margens ou sinais de lesão encapsulada. C) Achados semelhantes são observados na região lombar na imagem sagital ponderada em T1, na qual também é possível identificar uma cicatriz linear, secundária a uma ressecção cirúrgica prévia. 756

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