ABC | Volume 111, Nº5, Novembro 2018

Artigo de Revisão Silva et al miRNAs e doença cardiovascular Arq Bras Cardiol. 2018; 111(5):738-746 Figura 2 – Biomarcadores circulantes.Aqui são ilustrados alguns dos miRNAs encontrados no soro ou plasma sanguíneo que poderiam ser utilizados como biomarcadores de diagnóstico ou prognóstico de doenças cardiovasculares. uma vez que os miRNAs possuem alta estabilidade na corrente sanguínea e são de fácil detecção. Os miRNAs poderiam ser utilizados, por exemplo, como biomarcadores da insuficiência cardíaca (IC), fibrilação atrial, infarto agudo do miocárdio (IAM) e aterosclerose, por meio de sua detecção no plasma sanguíneo (Figura 2). Já está bem estabelecido que a presença do miR-1 no sangue auxilia a identificação do IAM, mas sua utilização como biomarcador a longo-prazo não é recomendada, devido ao curto tempo no qual ele permanece na circulação sanguínea. Sua curta meia-vida resulta provavelmente de sua liberação direta no sangue a partir do tecido cardíaco necrótico de forma não encapsulada pelo exossoma. 21 Quando há lesão cardíaca, miRNAs seriam liberados no sangue por meio de exossomos ou pela ruptura celular, podendo estar associados ou não a outras moléculas. Estas moléculas poderiam proteger os miRNAs contra a degradação, prolongando o seu tempo de permanência na circulação. Além disso, o aumento do fluxo sanguíneo, alteração do pH e a liberação de citocinas são fatores que também influenciam a meia-vida dos miRNAs circulantes. Por exemplo, foi verificado que omiR-1maduro exogenamente adicionado ao soro é rapidamente degradado tanto  in vitro quanto  in vivo. 22 Uma limitação ao uso demiRNA circulantes é a falta de normalização de sua quantificação, quando comparado ao miRNA tecidual. 23 Contudo, apesar dessas limitações, o miR-1 apresenta alta sensibilidade na identificação do IAM no momento inicial desse evento adverso. Diversos estudos relatam que o miR-499 possui acurácia diagnóstica superior a troponina T para o IAM. 24,25 A vantagem do miR-499 é que ele pode ser detectado no sangue em menos de quatro horas após o IAM, enquanto a troponina só pode ser detectada mais tardiamente. 26 Assim, miR-499 poderia aumentar a acurácia da troponina T no diagnóstico precoce do IAM. O estudo HUNT investigou 179 miRNAs em 212 indivíduos sadios com o objetivo de predizer IAM. Diversos miRNAs circulantes diferiram significativamente durante o período de acompanhamento entre indivíduos que posteriormente sofreram IAM e aqueles que permaneceram saudáveis. Após análise de regressão logística, foi observado que um conjunto de 5 miRNAs (miR-106a-5p, -424-5p, miR-144-3p, miR-660-5p e let-7g-5p) melhor prediziam o IAM, com 77% de acerto para ambos os gêneros. 27 Jia et al., 28 mostraram que os miR-30d-5p e -125b-5p também possuem valor diagnóstico para o IAM, quando avaliados em pacientes com síndrome coronariana aguda. 28 Em modelo animal de IAM cirúrgico, o miR-208a apresentou níveis circulantes elevados 4 horas e 24 horas após a indução do infarto. 25 Diversos estudos já foram realizados com o foco em se avaliar o valor prognóstico e/ou diagnóstico dos miRNAs na IC, assim como no tratamento da IC. Existem evidências de que os miRNAs desempenham um papel tanto no surgimento quanto na progressão da IC. Apesar do peptídeo natriurético cerebral (BNP) e do pró-peptídeo natriurético cerebral N-terminal (NT-proBNP) serem utilizados atualmente como padrão ouro no diagnóstico da IC, os miRNAs têm sido estudados exaustivamente como potenciais biomarcadores. Como exemplo, uma recente revisão sistemática com meta‑análise mostrou que o miR-423-5p, associado ao peptídeo natriurético atrial (ANP), teria um potencial valor diagnóstico para a detecção da IC. 29 Na IC crônica, Cakmak et al., 30 mostraram que o miR-182 teria maior valor prognóstico para mortalidade cardiovascular, caracterizada pela morte súbita inexplicável, IC descompensada ou arritmia hemodinamicamente significativa, comparado ao NT-proBNP e a proteína C reativa (PCR) de alta sensibilidade pela análise da curva ROC em pacientes com IC compensado (NYHA II, n = 20) e descompensados (NYHA III, n = 22), comparado a controles saudáveis (n = 15). 30 Um panorama mais completo dos miRNAs envolvidos na IC aguda e crônica pode ser visto na revisão recentemente publicada de Vegter e colaboradores. 31 Considerando os estudos em pacientes com fibrilação atrial (FA), já foi observado que pacientes com IC crônica estável com FA e fração de ejeção < 40% apresentam uma redução significativa dos níveis plasmáticos de miR-150 comparados aos seus controles saudáveis. 32 Harling et al., 33 estudaram o plasma coletado no pré-operatório 24 horas antes de cirurgia de revascularização miocárdica, para avaliar a precisão diagnóstica do miRNA na fibrilação atrial pós-operatória. Nesta análise, os autores mostraram o miR483-5p como um potencial biomarcador da FA pós-operatória, com precisão preditiva global de 78%. 33 Os miR-23a e -26a também teriam a capacidade de prever a FA pós-operatória, uma vez que seus 740

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