ABC | Volume 111, Nº4, Outubro 2018

Artigo Original de Souza e Silva et al Intervenção coronariana percutânea no estado do Rio de Janeiro Arq Bras Cardiol. 2018; 111(4):553-561 Introdução A doença isquêmica do coração (DIC) é a causa mais frequente de morte em adultos 1 e, embora sua taxa de mortalidade ajustada por idade tenha diminuído durante as últimas décadas, 2 a DIC ainda causa aproximadamente 20% de todas as mortes no mundo. 2,3 A terapia invasivamais frequentementeutilizada no tratamento daDICé a intervenção coronariana percutânea (ICP). 4 Desde que foi realizado pela primeira vez, 5-7 este procedimento tem sido mais e mais indicado, tornando‑se mais caro e possivelmente realizado excessivamente, 8,9 embora a maioria dos estudos realizados evidenciem apenas alguns cenários onde a ICP possa ser benéfica na DIC. 10,11 Além disto, as informações que guiam as decisões dos clínicos a respeito da sua indicação se baseiam principalmente em ensaios clínicos controlados randomizados (ECR), que geralmente envolvem pacientes mais jovens e com menos comorbidades do que os pacientes do mundo real, e excluemmuitos problemas de tratamento enfrentados na prática clínica. 12,13 Portanto, extrapolar a efetividade da ICP observada nos ECR para uma população do mundo real pode não ser totalmente apropriado. O objetivo deste estudo é fornecer informações sobre a efetividade da ICP em uma população de pacientes assistidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), avaliando as taxas de sobrevida em curto, médio e longo prazos de pacientes com DIC tratados com uma única ICP entre 1999 e 2010 paga pelo SUS no estado do Rio de Janeiro (ERJ). Métodos População do estudo e coleta de dados Os dados sobre ICP obtidos em bancos de dados administrativos do ERJ foram analisados retrospectivamente. O banco das Autorizações de Internação Hospitalar (AIH) fornecido pelo DATASUS foi consultado para juntar dados sobre as ICPs realizadas em hospitais públicos e privados pagas pelo SUS entre 1990 e 2010. O SUS é o Sistema Único de Saúde do Brasil. É financiado com fundos públicos, é unificado, universal e integral. 14 O DATASUS contém dados do Departamento de Informática em Saúde do Ministério da Saúde e administra as informações financeiras e de saúde do SUS. 15 AIH é um sistema de registro 16 de toda admissão que ocorre em hospitais públicos e privados conveniados ao SUS. Critérios para inclusão de pacientes: pessoas que residissem no ERJ, com ≥ 20 anos de idade, submetidas a uma única ICP entre 1999 e 2010. Critérios para exclusão de pacientes: indivíduos submetidos a cirurgia de revascularização miocárdica durante o período estudado. No banco de dados das AIH obtiveram-se: nome do paciente, sua data de nascimento, datas de internação e alta do hospital, sexo, endereço, nome da mãe e tipo de ICP. Os procedimentos de ICP foram classificados de acordo com os códigos do banco de dados das AIH, como descritos em um estudo prévio, 9 a saber: a) ICP sem colocação de stent (ICP-SS); b) ICP com colocação de stent (ICP-CS); e c) ICP primária (ICP-P). Durante o período do estudo, o SUS não pagou por stents farmacológicos; portanto, ICP-CS se refere ao uso de stents convencionais. Odesfecho pós-procedimento foi morte por qualquer causa, e as informações sobre a morte dos pacientes foram obtidas no banco de dados das declarações de óbito (DO) do ERJ de 1999 a 2014. Para combinar as informações de ambos os bancos de dados, das AIH e das DO, o método de relacionamento probabilístico do Stata®14 ( Reclink ) foi utilizado, uma vez que não há um campo de identificação comum entre os dois bancos de dados, e isto consiste essencialmente em um algoritmo de busca aproximada. Este método permite combinar pesos para cada variável pré-definida, criando assim uma nova variável com um escore em uma escala de zero a um, que indica a probabilidade de que os pares formados se refiram ao mesmo paciente. As variáveis pré-definidas foram o nome do paciente, data de nascimento e sexo. Pares que tiveram escore = 1,00 (combinações perfeitas) foram considerados pares verdadeiros. Pares que tiveram escore entre≥0,99 e<1.00 foram considerados combinações possíveis e foram revisados manualmente usando o nome da mãe e o endereço para definir se eles seriam considerados o mesmo paciente. Pares com escores menores do que 0,99 foram considerados “pares falsos”. Para testar a sensibilidade e a especificidade do método de relacionamento probabilístico usado, as mortes intrahospitalares encontradas no banco de dados das AIH foram comparadas às informações combinadas do banco de dados das DO. De um total de 357 mortes intrahospitalares encontradas no banco de dados das AIH, 307 foram encontradas no processo de relacionamento com o banco de dados das DO, e não foram detectados quaisquer falsos positivos. Portanto, a sensibilidade e a especificidade estimadas foram 86% e 100%, respectivamente. Depois do processo de relacionamento probabilístico, os pacientes foram classificados de acordo com sexo e faixas etárias: 20-49, 50-69 e ≥ 70 anos de idade. As causas de óbito foram obtidas no banco de dados das DO e classificadas de acordo com a 10ª revisão da Classificação Internacional de Doenças (ICD-10) 17 como DIC (códigos I20 a I25) ou doenças não isquêmicas do coração (qualquer outro código). Como o banco de dados das AIH não contém informações sobre a data exata do procedimento de ICP, somente a data da admissão e da alta hospitalar dos pacientes, e como a duração média da internação hospitalar desses pacientes foi de 2 dias, 9 para analisar a taxa de sobrevida a data da alta foi considerada o dia um. Taxas de sobrevida de curto e médio prazos foram definidas como a probabilidade de sobrevida até o 30º dia e um ano após a alta, respectivamente. Como há dois tipos de alta no banco de dados das AIH– alta hospitalar oumorte – os resultados de curto prazo incluíram a taxa de mortalidade intrahospitalar. Sobrevida de longo prazo foi definida como a probabilidade de sobrevida em até 10 ou 15 anos depois da alta hospitalar para comparações entre os tipos de ICP ou entre as faixas etárias e sexo, respectivamente. O estudo foi aprovado pelo comitê de ética do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (Faculdade de Medicina – UFRJ) em 18/10/2012 (1148/12). 554

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