ABC | Volume 111, Nº4, Outubro 2018

Artigo Original Martins Estratégia guiada por reserva de fluxo fracionada na SCA Arq Bras Cardiol. 2018; 111(4):542-550 Introdução A reserva de fluxo fracionada (do inglês “ fractional flow reserve , FFR”) é um método bem validado e eficaz para determinar a relevância funcional de lesões coronarianas intermediárias; a intervenção coronária percutânea (ICP) guiada pela FFR melhora os desfechos clínicos de pacientes com doença coronária estável. 1-3 Apesar dos dados consistentes a favor do uso da FFR na doença coronária estável, seu uso na síndrome coronariana aguda (SCA) não é tão bem investigado, uma vez que umamedida precisa da FFR requer uma hiperemia máxima. Em pacientes com SCA, alterações microvasculares podemprevenir a vasodilatação, afetando a validade da FFR. 1,4-6 Tais alterações parecem ser dependentes do vaso (culpado ou não culpado) e relacionadas ao tipo de infarto – infarto com supradesnivelamento do segmento IAMCSST vs. infarto sem supradesnivelamento do segmento IAMSSST. 7 Os valores de FFR no vaso culpado são reconhecidamente mais elevados quando medidos durante episódios agudos que os medidos depois que a microcirculação teve algum tempo para se recuperar. Supõe-se que valores mais altos de FFR sejam causados por níveis reduzidos de hiperemia no vaso culpado devido à embolização do trombo ou placa, disfunção microvascular isquêmica e miocárdio atordoado. Assim, a eficácia do uso da FFR em doença da artéria culpada ainda é incerta. 8,9 A doença coronária de múltiplos vasos, observada em aproximadamente 30-50% dos pacientes com IAMCSST e 30-59% dos pacientes com IAMSSST, está associada a um prognóstico ruim. 10-12 A revascularização de vasos considerados importantes do ponto de vista hemodinâmico, identificados no laboratório de hemodinâmica logo após o evento agudo, parece atrativo – essa abordagem fornece umplano terapêutico definitivo, bem estabelecido ao paciente. No entanto, vários estudos sugerem que uma estratégia de revascularização guiada por FFR reduz a taxa de revascularização coronária sem comprometer a segurança em curto prazo. 13-15 Contudo, os resultados dessa abordagem são inconsistentes em muitos estudos com pacientes sem SCA. 13,14 Portanto, os objetivos deste estudo é realizar uma revisão sistemática das evidências atuais sobre o adiamento da ICP com base na FFR em pacientes com SCA e as comparar com evidências dessa decisão em pacientes sem SCA. Métodos Fontes e busca dos dados Fizemos uma busca sistemática nas bases de dados MEDLINE, EMBASE e Cochrane Library de artigos relevantes publicados entre janeiro de 2000 e setembro de 2017. Também foram pesquisadas revisões sistemáticas qualitativas disponíveis, para a busca de estudos adicionais. Os termos “ Flow Fractional Reserve ” OR “ Acute Coronary Syndrome ” foram usados na busca. Além disso, as referências dos estudos identificados nessa estratégia de busca também foram revisadas quanto a artigos potencialmente relevantes não identificados na busca. Não houve restrição de idioma. Seleção dos estudos Primeiramente, o título e o resumo das citações foram rastreados por dois revisores independentes (JM e VA), que então selecionaram artigos completos. Outros estudos foram identificados revisando-se a bibliografia dos estudos incluídos e revisões relevantes. Discordâncias foram resolvidas por consenso. Os mesmos revisores avaliaram os artigos de forma independente, seguindo os seguintes critérios de inclusão: estudos que compararam os desfechos clínicos de lesões após adiamento da ICP com base na FFR entre pacientes com SCA e pacientes sem SCA (Figura 1). Desfechos Os desfechos estudados foram: mortalidade, mortalidade cardiovascular, infarto do miocárdio (IM), e revascularização do vaso alvo (TVR, do inglês target vessel revascularization ) durante o período de acompanhamento. TVR foi definida como revascularização subsequente do vaso, por ICP ou cirúrgica. Em todos os estudos, no grupo SCA, a distinção entre lesões culpadas e não culpadas foi feita pelo cirurgião, sendo, portanto, subjetiva, tal como ocorre na prática clínica. Análise estatística As variáveis contínuas foram expressas em média ± desvio padrão ou mediana (intervalo interquartil), e as variáveis categóricas expressas em números e porcentagens. Para calcular o efeito conjunto, utilizamos o inverso da variância assumindo um modelo de efeitos mistos e o método de DerSimonian e Laird assumindo um modelo de efeitos aleatórios. 16 A homogeneidade entre os estudos foi avaliada pelo teste Q de Cochran e estatística I2 (os valores 0,25, 0,50, e 0,75 indicaram graus baixo, moderado e alto de heterogeneidade, respectivamente). O viés de publicação foi avaliado pelo gráfico de funil. Realizamos uma análise de sensibilidade para avaliar o impacto de cada estudo sobre os resultados. O MetaXL 2,0 ( EpiGear International Pty Ltd, Wilston, Queensland, Austrália) foi usado para calcular o tamanho do efeito sobre a diferença do risco (diferença no risco de ocorrência entre o grupo tratado por revascularização e o grupo que recebeu tratamento conservador). Resultados Identificação do estudo Inicialmente, a estratégia de busca identificou 129 citações. Dessas, 96 artigos foram excluídos após revisão do título e do resumo. Após avaliação dos estudos quanto aos critérios de seleção, excluímos outros 26 artigos. Um total de 7 estudos atingiram os critérios para a metanálise, incluindo 5107 pacientes (3540 sem SCA e 1567 com SCA). Características dos estudos incluídos Dos 7 estudos incluídos, 1 estudo foi prospectivo, e 6 eram observacionais, com delineamento retrospectivo (Tabelas 1 e 2). 543

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