ABC | Volume 111, Nº4, Outubro 2018

Relato de Caso Quantificação da Reserva de Fluxo Coronariano Obtida em Gama Câmara CZT na Avaliação de Doença Coronariana Multiarterial Quantification of Coronary Flow Reserve with CZT Gamma Camera in the Evaluation of Multivessel Coronary Disease Ana Carolina do Amaral Henrique de Souza, 1 Bernardo Kremer Diniz Gonçalves, 1 Angelo Tedeschi, 1 Ronaldo de Souza Leão Lima 1,2 Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), 1 Rio de Janeiro, RJ - Brasil Clínica de Diagnóstico por Imagem, 2 Rio de Janeiro, RJ - Brasil Correspondência: Ana Carolina do Amaral Henrique de Souza • Av. Jornalista Alberto Francisco Torres, 67 apto 601, CEP 24230-000, Icaraí, Niterói, RJ – Brasil E-mail: ana_carolina_amaral@hotmail.com Artigo recebido em 24/01/2018, revisado em 10/05/2018, aceito em 10/05/2018 Palavras-chave Reserva Fracionada de Fluxo Miocárdio; Doença Arterial Coronariana; Reserva de fluxo coronariano/métodos; Diagnóstico por Imagem; Imagem de Perfusão do Miocardio. DOI: 10.5935/abc.20180196 Introdução A avaliação de pacientes com doença coronariana multiarterial por meio da cintilografia miocárdica de perfusão (CMP) permanece um desafio, dada a possibilidade de subestimação da extensão e gravidade da doença. Esse fenômeno ocorre em parte devido à isquemia balanceada e inabilidade dos equipamentos tradicionais de identificar pequenas mudanças no fluxo coronariano na fase de estresse. 1,2 Novas gama câmara com detectores de telureto de cádmio e zinco (CZT), já comercialmente disponíveis, apresentam maior resolução temporal e espacial, 3-5 teoricamente possibilitando a aquisição dinâmica de imagens e a quantificação do fluxo sanguíneo miocárdico (FSM) e da reserva de fluxo coronariano (RFC) de forma absoluta. 6,7 Essa ferramenta, já bem estabelecida com a tomografia por emissão de pósitrons (PET), 8-10 pode ser promissora para acessar de forma não invasiva a doença coronariana obstrutiva de três vasos, utilizando a cintilografia e seus radiotraçadores convencionais. O objetivo desse relato é descrever o cálculo da reserva de fluxo coronariano no contexto diagnóstico de um paciente com doença multiarterial, cuja imagem de perfusão miocárdica mostrava defeito não compatível com a coronariografia. Caso clínico Paciente de 58 anos foi atendido pela primeira vez em ambulatório universitário de Cardiologia com queixa de dispneia aos médios esforços e melhora com repouso. A história clínica incluía hipertensão arterial, dislipidemia e história familiar positiva. O paciente não se encontrava em acompanhamento clínico regular ou com medicação otimizada. Ecocardiograma transtorácico realizado há nove meses não mostrava alterações e o paciente foi encaminhado para realização de cintilografia miocárdica de perfusão em serviço especializado. Seguiu-se protocolo de um dia, com fase de repouso seguida de fase de estresse farmacológico com dipiridamol e 99m Tc-sestamibi como radiotraçador, nas doses de 10 e 30mCi em repouso e estresse, respectivamente. As imagens foram adquiridas em uma gama câmara CZT (Discovery 530, GE Healthcare), tendo sido realizada a quantificação do FSM e da RFC em um contexto de pesquisa clínica, acoplada ao protocolo de aquisição das imagens perfusionais. O protocolo foi iniciado pela injeção endovenosa de 1 mCi de 99m Tc-sestamibi para posicionamento do coração no campo de visão da gama câmara. A fase de repouso se deu com a aquisição das imagens dinâmicas por onze minutos, seguida imediatamente das imagens de perfusão durante cinco minutos. Com o paciente ainda posicionado na gama-câmera, realizou-se a fase de estresse farmacológico com dipiridamol (0,56 mg/kg) para aquisição de imagens dinâmicas durante onze minutos e perfusionais durante três minutos. As imagens mostraram pequena área de isquemia inferolateral, sem alterações contráteis. Foram identificados valores reduzidos de RFC em todos os territórios coronarianos, bem como do fluxo absoluto (ml/min/g) nas fases de repouso e estresse (Figura 1). Após a cintilografia, os sintomas persistiram, apesar da otimização terapêutica, e o paciente foi encaminhado para realização de coronariografia, que revelou doença coronariana obstrutiva de três vasos, com lesão segmentar de 90% do terço proximal da artéria descendente anterior, lesão proximal de 75% no segundo ramo diagonal, circunflexa com lesão de 75% ostial em primeiro e terceiro ramos marginais, além de lesão segmentar de 75% no ramo ventricular posterior. Na coronária direita, foi constatada lesão longa de 50% no terço médio, além de lesão de 75% na bifurcação dos ramos descendente e ventricular posteriores (DP/VP), comprometendo em 90% o ramo VP. Discussão Esse é o primeiro relato de quantificação da RFC utilizando umagamacâmaraCZTemnossopaís.Oprotocoloparaaquisição das imagens se mostrou seguro e adequado para a geração de imagens de boa qualidade. O caso apresentado representa claramenteumasituaçãoemqueaCMPnãoécapazdeidentificar a extensão da isquemia em razão de doença multiarterial. Tal fenômeno encontra-se em conformidade com a literatura, que já descreveu baixa prevalência de defeitos perfusionais em populações de pacientes com doença obstrutiva de três vasos. 1 Uma das razões para a ocorrência deste fenômeno é a isquemia balanceada. Tendo em vista que a CMP avalia apenas o fluxo relativo, ou seja, baseia-se na comparação de uma parede miocárdica com outra cuja captação de radiotraçador é maior, em situações como a descrita ocorre uma redução global do fluxo, o que gera pouca ou nenhuma heterogeneidade e, portanto, uma imagem possivelmente normal. 635

RkJQdWJsaXNoZXIy MjM4Mjg=