ABC | Volume 111, Nº2, Agosto 2018

Artigo Original Marcolino et al Satisfação de médicos dos serviços de urgência Arq Bras Cardiol. 2018; 111(2):151-159 Introdução Nas últimas décadas, foi observada redução importante na taxa de mortalidade por doenças cardiovasculares, relacionada a avanços na prevenção primária e no tratamento da síndrome coronariana aguda. 1-4 Apesar de ser uma tendência mundial, essa redução é mais pronunciada em países desenvolvidos, onde é possível ter acesso ao tratamento adequado em tempo oportuno. 5  De acordo com os dados do Sistema de Informação de Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde, em 2015, foram registrados aproximadamente 350 mil mortes por doenças cardiovasculares, que no Brasil, permanecem como a primeira causa de mortalidade proporcional, sendo responsáveis por 27,6% dos óbitos em 2015, e a principal causa de anos de vidas perdidos por morte prematura. 6 Entre as doenças cardiovasculares, o infarto agudo do miocárdio (IAM) é a causa mais frequente de morte (26,0%) 6 e a mortalidade em serviços públicos de saúde é mais elevada que em serviços privados. 7 Tal diferença pode ser atribuída a dificuldades no acesso do paciente com IAM ao tratamento em terapia intensiva, aos métodos de reperfusão e às medidas terapêuticas estabelecidas para o infarto. 7,8 Essas dificuldades podem ter um impacto negativo na satisfação dos profissionais de saúde ligados aos serviços de urgência, o que, por sua vez, pode ter influência negativa na fixação desses profissionais em regiões com carência de estrutura em saúde. É reconhecida hoje a crise dos serviços de urgência e emergência. 9 Portanto, a avaliação dos fatores relacionados a essa crise, inclusive a satisfação dos profissionais com a estrutura de cuidado em saúde, tem fundamental importância. A Região Ampliada Norte de Minas Gerais abrange 89 municípios, ocupando uma área de aproximadamente 128 mil km², com cerca de 1.594.000 habitantes. Diferencia‑se do restante do estado de Minas Gerais, apresentando índice de desenvolvimento humano próximo ao dos estados mais pobres do nordeste do Brasil. 10 Como no restante do país, o atendimento especializado é concentrado no maior município da região, Montes Claros, e a mortalidade por infarto era muito elevada, 11 o que motivou a implantação de umprojeto para organizar a Rede de Atenção ao IAMna região. O objetivo deste estudo é avaliar a satisfação dos profissionais médicos com a estrutura de atendimento e diagnóstico de serviços públicos de urgência na Região Ampliada Norte de Minas Gerais previamente à implantação da linha de cuidado ao IAM na região. Métodos Organização das Redes de Atenção às Urgências e Emergências na Região Ampliada Norte de Minas Gerais A rede de atenção a Urgência e Emergência na Região Ampliada Norte de Minas Gerais é uma rede integrada, que conta como serviço de atendimentomóvel de urgência (SAMU) regionalizado, hospitais micro e macrorregionais. O Projeto Estadual de Redes de Atenção organizou os hospitais em níveis de resposta, de acordo com a especialização, aos dois principais problemas que impactamnos anos potenciais de vida perdidos: o trauma grave e a urgência cardiovascular e cerebrovascular. 12 O SAMU tem abrangência macrorregional, estando presente em 86 dos 89 municípios da região, com 7 unidades de suporte avançado, com condutor-socorrista, enfermeiro e médico; e 40 unidades de suporte básico, com condutor- socorrista e dois técnicos de enfermagem; e um veículo de interceptação rápida. A central de regulação é única. Quanto aos hospitais regionais: • Hospitais de nível I: apresentam vários dos procedimentos chamados de “alta-complexidade”, incluindo neurocirurgia, cirurgia vascular e angiografia intervencionista, sala de ressuscitação (vermelha) com radiografia móvel e ultrassonografia, tomografia computadorizada, sala cirúrgica de grande porte, heliponto com acesso exclusivo, equipe cirúrgica do trauma, unidade transfusional, além de número diferenciado e especializado de leitos de terapia intensiva e unidade coronariana. • Hospitais de nível II: localizados em municípios com mais de 200.000 habitantes, com requisitos semelhantes aos hospitais de nível I, exceto pela ausência de angiografia, cirurgia vascular e unidade coronariana. • Hospitais de nível III: localizados em municípios com mais de 100.000 habitantes e se prestam à estabilização dos pacientes até a transferência definitiva para o hospital de primeiro ou segundo nível. São requisitos mínimos: emergencista, cirurgia geral, radiologia, anestesiologia, centro de transfusão e terapia intensiva geral. • Hospitais de nível IV: situados em áreas de vazios assistenciais que estejam acima de 60 minutos de uma referência hospitalar microrregional. 12,13 A implantação da Rede de Atenção ao Infarto Agudo do Miocárdio na Região Ampliada do Norte de Minas Gerais: projeto Minas Telecardio II O Projeto Minas Telecardio II teve como objetivo implantar e avaliar a Rede de Atenção ao IAM na região ampliada do Norte de Minas Gerais e avaliar o seu impacto na mortalidade por IAM. Trata-se de estudo quase-experimental, iniciado em 19 de junho de 2013 e finalizado em 19 de maio de 2015, realizado em três etapas: (i) estabelecimento da linha de base; (ii) implantação da linha de cuidado ao IAM com implantação do sistema de tele-eletrocardiologia móvel e do novo fluxo de atendimento, além de treinamento dos profissionais de saúde dos serviços de urgência pré-hospitalar e hospitalar da região e (iii) reavaliação dos indicadores de qualidade do cuidado após a implantação. Todas as fases já foram concluídas, descritas em detalhe em outra publicação. 14 A satisfação da equipe de médicos com a estrutura de atendimento e cuidado às doenças cardiovasculares foi um dos componentes avaliados na linha de base do estudo e será objeto deste artigo. Delineamento do estudo e avaliação da satisfação Trata-se de estudo transversal. Participaram da avaliação médicos que trabalhavam nas unidades de emergência do SAMU e em hospitais regionais níveis II, III e IV, que compõem 152

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