ABC | Volume 111, Nº2, Agosto 2018

Artigo Original Sampaio et al Monitorização do ritmo, fibrilação atrial e acidente vascular cerebral Arq Bras Cardiol. 2018; 111(2):122-131 Introdução A Fibrilação Atrial (FA) é o fator preditivo mais importante de Acidente Vascular Cerebral isquêmico (AVC). 1 Vários estudos sugerem que curtas salvas de taquicardia atrial (TA) ou extrassístoles supraventriculares (ESSV) frequentes podem traduzir um estágio inicial de remodelamento do átrio esquerdo e seriam preditores de FA e risco aumentado de AVC. 2-4 O risco de AVC independe do modo de apresentação da FA e estudos recentes mostram que até 30% deles tem a arritmia diagnosticada antes, durante ou após o evento isquêmico inicial. 5 O diagnóstico de FA requer sua documentação, e a detecção da FA paroxística pode representar um desafio. 6 Por convenção, o diagnóstico de FA demanda uma duração mínima de 30 segundos. 7 Existe controvérsia sobre o valor prognóstico da FA de curta duração e alguns autores sugerem que sua ocorrência pode não ser uma condição benigna. 8 A detecção de FA paroxística tem sido realizada por diferentes técnicas de monitorização, e a importância de sua detecção precoce deve-se ao fato de que o pronto início de anticoagulação diminui significantemente o risco da recorrência do AVC em até 40%. 8-10 A American Heart Association e a Stroke Association recomendam o uso de monitorização eletrocardiográfica prolongada por 30 dias para diagnóstico de FA pós-AVC criptogênico (classe IIa; nível de evidencia C). Evidências adicionais são necessárias para apoiar essa recomendação, bem como para estabelecer o papel dos episódios de curta duração. 11,12 O objetivo deste estudo foi avaliar o desempenho de um novo sistema demonitorização eletrocardiográfica ambulatorial, utilizando transmissão por telefonia celular no diagnóstico de FA na fase aguda do AVC ou ataque isquêmico transitório (AIT), comparado com Holter nas primeiras 24 horas, e avaliar a incidência e o tipo de arritmias supraventriculares detectadas em pacientes com e sem AVC/AIT na fase aguda. 13 Métodos Amostra: Foram selecionados pacientes com diagnóstico de AVC/AIT recentes (menos de 15 dias da ocorrência), com base em achados clínicos e de imagens. A classificação do AVC (em criptogênico ou não) foi realizada usando-se o sistema de classificação proposto pelo Trial of Org 10172 in Acute Stroke Treatment (TOAST). 14 Pacientes ambulatoriais sem diagnóstico de AVC/AIT, mas com fatores de risco para estes eventos (grupo controle), ambos com eletrocardiograma ECG em ritmo sinusal e sem história pregressa de FA ou flutter atrial (FLA). Os critérios de exclusão foram pacientes com história clínica de FA/FLA ou ECG na internação com FA/FLA, pacientes com AVC hemorrágico, idade inferior a 18 anos, residentes em área sem cobertura de telefonia celular, pacientes com indicação de internação em centros de tratamento intensivo devido à gravidade do quadro e maior dificuldade de manuseio, pacientes com sequela de lesão neurológica prévia ou portadores de déficit cognitivo importante que prejudicasse a compreensão das instruções relativas ao uso dos aparelhos na ausência de responsáveis pelos mesmos. Os pacientes com suspeita de AVC/AIT foram atendidos em dois hospitais de médio porte, da rede pública da cidade de Curvelo, Minas Gerais, Brasil, entre agosto de 2016 e abril de 2017. Os pacientes do grupo controle foram selecionados durante atendimento ambulatorial. O seguimento e conduta terapêutica foram deixados a critério dos médicos assistentes. Todos os participantes ou seus representantes legais foram convidados a participar do estudo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário São José/FELUMA e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. Instrumentos de medida: o diagnóstico de AVC/AIT foi confirmado por tomografia computadorizada (TC) e/ou ressonância magnética (RM), realizados por radiologistas experientes em tomógrafos Siemens Somatom Spirit ou Toshiba Asteion4 , e RM GE Optima 360 de 1,5 teslas e classificados segundo os critérios de etiologias presumidas pelo TOAST. 14 Dados demográficos e exames clínicos: Foram coletadas idade, sexo, cor, local de residência, anamnese, história pregressa de doenças e familiar, peso, altura, fatores de risco cardíaco tradicionais, e escores CHADS 2 e CHA 2 DS 2 -VASc e realizados exames cardiológico e neurológico. Exames complementares: ECG de 12 derivações , ecocardiograma transtorácico, Doppler de artérias carótidas e vertebrais, raio-X de tórax em projeção posterior-anterior (PA) e de perfil, análise laboratoriais incluindo hemograma, ureia, creatinina, glicose, transaminases, GGT, potássio, sódio, TSH, T4 livre, colesterol total e fracionado, triglicérides, tempo de protrombina (TP) e tempo de tromboplastina parcial (TTP). Monitorização do ritmo: Após diagnóstico clínico de AVC isquêmico criptogênico ou AIT e sua notificação, os pacientes eram monitorizados ainda na primeira semana de evolução, com o Holter por 24h usando gravadores digitais de três canais – DMS 300-8 e DMS 300-9 e analisados pelo software da DMS CardioScan II ( DM Software Inc. Stateline, NV, EUA) e concomitantemente com o Policardiógrafo IP® (PoIP) (eMaster, Belo Horizonte, MG). Monitorização com o PoIP: Os monitores do PoIP coletam e transmitem os dados, de forma autônoma e em tempo real, pela conexão General Packet Radio Services/ Enhanced Date Rates for GSM Evolution  (GPRS/ EDGE); os dados em seguida são armazenados em nuvem. Em todos os pacientes foi usado a operadora de telefonia celular móvel Vivo, para transmissão de dados para o portal PoIP na web , e analisados usando o navegador Mozilla Firefox . O Portal de Exames é um aplicativo que permite gerenciar os aparelhos PoIP e exames realizados por meio de credenciais de acesso individualizadas (Figura 1). Foram utilizados seis eletrodos numa configuração que permitia monitorização das derivações do plano frontal além de V 1 -V 2 . Os pacientes e familiares foram orientados e treinados quanto ao modo de monitorização, qualidade do sinal de transmissão, carga da bateria e quanto à forma de recarregar a bateria de íon lítio (4h a cada 12h). Foram aconselhados a manter a monitorização durante os períodos em que a bateria era recarregada. A monitorização foi rigorosamente acompanhada via internet pela equipe responsável pela mesma, para determinar se o paciente estava em uso correto do aparelho, certificar a qualidade do contato com os eletrodos e se necessário informar aos mesmos, familiares ou cuidadores dos pacientes da conformidade do sistema e qualidade dos dados transmitidos. 123

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