ABC | Volume 111, Nº1, Julho 2018

Minieditorial Disfunção Ventricular Direita no Lúpus com Hipertensão Pulmonar Right Ventricular Dysfunction in Lupus Patients With Pulmonary Hypertension Silvio Henrique Barberato Cardioeco – Centro de Diagnóstico Cardiovascular, Curitiba, PR – Brasil Minieditorial referente ao artigo “Avaliação Precoce da Função Ventricular Direita em Pacientes com Lúpus Eritematoso Sistêmico pelo Strain e Strain Rate” Correspondência: Silvio Henrique Barberato • Rua Rezala Simão, 1316/ Casa 28. CEP 80330-180, Santa Quitéria, Curitiba, PR – Brasil E-mail: silviohb@cardiol.br Palavras-chave Disfunção Ventricular Direita/fisiopatologia; Lupus Eritematoso; Doenças Cardiovasculares; Pneumopatias; Hipertensão Pulmonar; Ecocardiografia; Strain; Strain Rate . DOI: 10.5935/abc.20180125 A importância do ventrículo direito (VD) na fisiologia cardiovascular foi subestimada por décadas. Antes considerado apenas um conduto, sabe-se atualmente que seu desempenho é fundamental para manter a função cardíaca global intacta. Em paralelo, demonstrou-se que a função sistólica do VD é um determinante essencial de desfechos clínicos em diversos cenários 1 e deve, portanto, ser considerada no manejo individualizado dos pacientes. Assim, a necessidade do diagnóstico da disfunção do VD é evidente. Pela ampla disponibilidade, a ecocardiografia é a modalidade de imagem mais utilizada na prática clínica para a avaliação do tamanho e função do VD. Essa análise pode ser dificultada devido à complexa anatomia do VD, de forma que importantes sociedades internacionais de imagem cardiovascular têm recomendado a adição rotineira e sistemática de diversas medidas e técnicas ecocardiográficas. 2,3 Essa abordagem inclui parâmetros convencionais, tais como diâmetro basal do VD (normal ≤ 41 mm), excursão sistólica do plano anular tricúspide (TAPSE - normal ≥ 17 mm) e parâmetros avançados, tais como onda s da parede livre do VD ao Doppler tecidual (normal ≥ 9,5 cm/s), fração de ejeção ao ecocardiograma 3D (normal ≥ 45%) e s train longitudinal da parede livre do VD (normal ≥ -20%), entre outros. Nesse cenário, strain (porcentual de encurtamento sistólico) e strain rate (taxa de velocidade desse encurtamento), calculados por meio do rastreamento de pontos pela ecocardiografia bidimensional (2D speckle tracking ou 2D-STE), emergem como alternativas de destaque na análise da função sistólica do VD. O strain longitudinal da parede livre do VD, ou seja, excluindo o septo interventricular, mostrou valor prognóstico empacientes com sinais e sintomas de doença cardiopulmonar, tais como insuficiência cardíaca, infarto do miocárdio, hipertensão pulmonar, cardiopatias congênitas, cardiomiopatia arritmogênica do VD e amiloidose. 1 O strain longitudinal do VD é um parâmetro menos dependente do ângulo, com menor variabilidade intra- e interobservador, e aparentemente capaz de detectar precocemente a disfunção ventricular direita. Suas desvantagens incluem a alta dependência da qualidade de imagem e a variabilidade entre os softwares dos equipamentos disponíveis no mercado. 3 Recente consenso internacional foi elaborado para padronizar o emprego do 2D-STE na obtenção do strain do VD. 4 É recomendado o uso específico do corte apical 4 câmaras focado no VD para a correta aferição das medidas do strain . Extremo cuidado deve ser tomado na definição da região de interesse (sigla em inglês ROI) da borda endocárdica (sugere-se ROI de 5 mm), devido ao formato e às paredes finas do VD. O pericárdio deve ser excluído da análise, sob o risco de subestimativa do strain . O estudo de Luo et al., 5 publicado nesta edição dos Arquivos Brasileiros de Cardiologia , demonstra que a avaliação de strain e strain rate por 2D-STE pode detectar precocemente disfunção ventricular direita em portadores de lúpus eritematoso sistêmico (LES) associado a hipertensão pulmonar (HP) discreta (pressão sistólica da artéria pulmonar [PSAP] entre 30 e 50 mmHg) e subclínica. Importante ressaltar que, à luz dos demais parâmetros convencionais e não convencionais de tamanho e função sistólica do VD, a disfunção ventricular direita só foi diagnosticada em indivíduos com HP moderada a grave (PSAP ≥ 50 mmHg). É preciso reconhecer pequena limitação metodológica na estimativa da pressão no átrio direito, que assumiu apenas dois valores (8 ou 15 mmHg) pela análise da dinâmica da veia cava inferior. Isso pode ter superestimado a PSAP em alguns pacientes, mas tal viés não invalida os resultados do estudo. Dados apontam que as taxas de sobrevida dos pacientes com LES que desenvolvem HP parecem ser menores do que as dos portadores de HP primária. 6 Os achados de Luo et al., 5 permitem especular que a disfunção ventricular direita seja o mediador do alto risco de mortalidade nesse grupo de indivíduos. Em termos práticos, os achados do estudo sugerem que o uso do strain na análise da função sistólica do VD no LES pode selecionar os pacientes em fase subclínica que demandam vigilância atenta e terapia precoce para prevenir o desenvolvimento de insuficiência ventricular direita e complicações cardiovasculares. Novas investigações são necessárias para aprofundar o conhecimento fisiopatológico da disfunção ventricular direita no contexto clínico do LES e testar o papel de estratégias de intervenção direcionadas para a redução da mortalidade. 82

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