ABC | Volume 110, Nº6, Junho 2018

Artigo Original Nascimento et al Doenças Cardiovasculares em Países de Língua Portuguesa Arq Bras Cardiol. 2018; 110(6):500-511 Informações detalhadas das métricas de carga de doença relacionadas às DCV e estratificadas pelos PLP estão disponíveis nas Tabelas Suplementares. Discussão O português é a sexta língua mais falada do globo, por 244 milhões de pessoas, 16 a quinta mais usada na Internet , por 82,5 milhões de cibernautas, e a terceira nas redes sociais Facebook e Twitter , por 58,5 milhões de utilizadores. 17 Segundo estimativas do governo português, tendo em conta a evolução demográfica, até 2050 o número de pessoas no mundo que falará a língua portuguesa deverá aumentar para 335 milhões. A previsão é de que a África deverá superar o Brasil em crescimento do uso do português dentro de 50 anos. 16 O português é língua oficial de oito países (Portugal, Brasil, Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Timor Leste). Apesar da incorporação de vocábulos nativos e de modificações gramaticais e de pronúncia próprias de cada país, as línguas mantêm uma unidade com o português de Portugal, de onde foram colônias quando do processo expansivo daquela nação. A independência do domínio português ocorreu em períodos diversos, sendo que a Guiné Equatorial pertenceu ao império português somente até 1778, sendo posteriormente foi cedida para a Espanha, e o Brasil foi colônia até 1822. As demais nações tiveram sua independência reconhecida por Portugal entre os anos de 1973 e 1975. Porém, a influência cultural de Portugal nesses países foi bastante marcante, exemplificada pela religião oficial ser a católica em sua maioria, os sobrenomes de origem portuguesa serem predominantes, bem como a organização dos sistemas de saúde, que são semelhantes em vários aspectos. 2,18 Ainda que mantenham uma identidade cultural, o desenvolvimento socioeconômico ocorreu de forma heterogênea. O SDI, em 2015, era tão baixo quanto 0,28 e 0,29 na Guiné-Bissau eMoçambique, respectivamente, embora no Brasil (0,66) e na Guiné Equatorial (0,61) se aproximassemais daquele observado em Portugal (0,75). Omesmo ocorreu com o Produto Interno Bruto per capita (PIB per capita), quantificado em dólares americanos no mesmo ano, que variaram entre 606 e 611 - na Guiné-Bissau e Moçambique, 20.247 e 21.619 - na Guiné Equatorial e Portugal, respectivamente. Os gastos públicos com saúde representaram percentuais diversos, estando em 2013 na faixa de 2% a 3% do PIB da maioria desses países, destacando-se Portugal e Timor-Leste com percentuais mais elevados, que variaram entre 9,1% e 10,4%, respectivamente, enquanto o Brasil se encontra em um nível intermediário, atualmente com 4% do PIB. 2 Um aspecto importante dos resultados deste estudo é mostrar que em todos os PLP, com exceção de Guiné Bissau, foram observadas as reduções das taxas de mortalidade por DCV padronizadas por idade de 1990 a 2016. De forma global, o período foi marcado pela redução da mortalidade por DCV padronizada por idade em todos os países de alta renda e em alguns de renda intermediária, embora pouca modificação pôde ser observada na maioria dos países da África Subsaariana (ASS). 7 Nos PLP, houve uma forte correlação positiva entre o SDI e a redução das taxas de mortalidade por DCV padronizadas por idade observada nos últimos 27 anos. No entanto, esse padrão não foi homogêneo sugerindo que outros fatores 19 poderiam estar associados com as reduções de mortalidade observadas. No Brasil e em Portugal essa correlação foi mais estreita. A queda nas taxas de mortalidade padronizadas por idade no Brasil, associadas ao aumento da expectativa de vida, e manutenção da mortalidade proporcional em torno de 30%, de 1990 a 2016, apontam para maior relevância da redução do componente de mortalidade precoce. 20 A melhoria das desigualdades sociais observadas no Brasil e em alguns PLP pode ter contribuído para essa redução de mortalidade heterogênea em relação aos demais países da ASS. 21 É importante ressaltar que, no total de óbitos ocorridos na ASS, em 2015, a cardiopatia isquêmica representou a quinta causa de morte, precedida pelas causas infecciosas, em ambos os sexos; o acidente vascular encefálico (AVE) hemorrágico, a sétima; o diabetes mellitus , a oitava; e o AVE isquêmico, a décima-quinta causa de óbitos, em ambos os sexos. 18 Por outro lado, em 2016, nos PLP, as DCV representaram a primeira causa de óbito em quase todos os países, excetuando-se na Guiné-Bissau, onde foi a segunda, e em Moçambique e na Guiné Equatorial, onde foi a terceira maior causa de óbito, em ambos os sexos. As cardiopatias isquêmicas predominaram em todos os PLP, excetuando-se em Moçambique e São Tomé e Príncipe. Esse padrão discordou do observado nos demais países da ASS, 18 sugerindo uma similaridade entre os PLP. Os DALYs foram reduzidos nos PLP ao longo da série temporal, de 1990 a 2016, provavelmente refletindo uma melhoria nos cuidados de saúde dessas populações. 22 Os DAYLs se deveram principalmente às cardiopatias isquêmicas e às DCbV nesse grupo de países. Essa redução foi maior nos que apresentaram maiores SDI. Porém, o SDI não explicou de forma relevante a redução dos DALYs por DCV em uma análise do GBD de 1990-2013, principalmente devido a heterogeneidade do conjunto dos países observados. 22 Os níveis de pressão sistólica e diastólica diminuíram de 1995 a 2015 em grande parte dos países de alta renda. 23 Esse efeito não ocorreu na maioria dos países da ASS, 23 o que poderia explicar a predominância da DCbV como componente mais importante da mortalidade por DCV nos países da ASS, para a qual também contribuíram o aumento da massa corporal e os fatores dietéticos. 24 O mesmo ocorreu nos PLP, onde a hipertensão arterial e os fatores dietéticos tiveram influência mais relevante, em ambos os sexos, para os DAYLs em decorrência das DCV. Destaca-se a importância dos fatores de risco dietéticos na maioria dos PLP, sob influência do padrão alimentar globalizado, com alimentos ultra processados, com excesso de açucares e gorduras, modificando padrões alimentares tradicionais mais saudáveis. Esses fatores de risco podem ser modificados mediante a promoção de políticas de alimentação saudável, taxação de alimentos ultra processados, subsídios a alimentos saudáveis como frutas, legumes e hortaliças. 25,26 As populações africanas são caracterizadas por uma grande diversidade genética e representam o repositório do material genético do homem moderno que se espalhou pelo mundo nos últimos 100 mil anos, possuindo adaptações genéticas em resposta aos diferentes climas, dietas, ambientes geográficos e agentes infecciosos aos quais foram expostos. 27 As variações genéticas da ASS foram modeladas 508

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