ABC | Volume 110, Nº5, Maio 2018

Artigo Original Oliveira et al Exercício na insuficiência cardíaca aguda Arq Bras Cardiol. 2018; 110(5):467-475 Introdução A insuficiência cardíaca (IC) é uma síndrome complexa caracterizada por função ventricular esquerda diminuída, miopatia esquelética e intolerância ao exercício. 1,2 Estudos prévios mostraram evidências de que o exercício pode ser uma intervenção não farmacológica efetiva para pacientes com IC crônica. 3-6 Contudo, períodos de IC aguda ou descompensada podem ocorrer, os quais representam a causa mais frequente de internações, 7 com longos períodos de repouso, sarcopenia 8,9 e, consequentemente, complicações durante a internação. Pacientes com IC aguda apresentam piora na congestão pulmonar, dispneia, esforço respiratório aumentado, intolerância ao exercício, 10 e frequentemente, ventilação alveolar diminuída, que resulta em desvio de sangue e hipoxemia. 11 Nesse contexto, a ventilação não-invasiva (VNI) tem sido amplamente utilizada em casos de IC aguda para reduzir dispneia e melhorar a oxigenação. 12,13 Além disso, pacientes com IC crônica apresentam uma redução progressiva na capacidade funcional e menor tolerância ao exercício em comparação a indivíduos saudáveis, tanto devido à doença cardíaca como a fatores periféricos (disfunção endotelial, inflamação, e ativação neuro-hormonal aumentada). 14,15 Além disso, já foi demonstrado que o exercício combinado com VNI na IC crônica aumenta a tolerância ao exercício e reduz dispneia e fadiga nos membros inferiores. 16,17 Vários estudos demonstraram que o exercício precoce após a internação pode beneficiar pacientes críticos na unidade de tratamento intensivo 18,19 e em pacientes com exacerbação da doença pulmonar obstrutiva. 20,21 Esses estudos mostraram uma redução no tempo de internação hospitalar, e na taxa de reinternação, bem como melhora na qualidade de vida. Contudo, o exercício tem sido contraindicado aos pacientes com IC, porém não há estudos que avaliaram os efeitos da reabilitação cardíaca sobre a IC aguda ou descompensada. Nesse contexto, apesar das evidências amplamente documentadas a respeito dos benefícios do exercício físico 5,22 e da VNI combinada com exercício 16 em pacientes com IC crônica, a segurança e a efetividade do exercício aeróbico em pacientes com IC aguda ainda são desconhecidas. Portanto, no presente estudo, nosso objetivo foi investigar em pacientes com IC aguda ou descompensada: (i) a segurança do exercício aeróbico realizado durante a internação hospitalar; (ii) a eficácia do exercício aeróbico associado à VNI durante a internação em pacientes com IC aguda. Métodos Trata-se de um estudo controlado, prospectivo e randomizado. Uma amostra de conveniência de 29 pacientes foi recrutada da enfermaria de miocardiopatias de um hospital de cardiologia. Esses pacientes apresentavamdiagnóstico clínico estabelecido de IC aguda e fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) menor que 30%, de acordo com o exame de ecocardiografia com Doppler. Todos os pacientes foram classificados em classe funcional IV segundo a classificação da New York Heart Association (NYHA). Foram excluídos do estudo pacientes com angina instável, arritmias complexas, marcapasso, terapia de ressincronização cardíaca ou dispositivo de assistência ventricular esquerda, infarto do miocárdio nos últimos 12 meses, saturação de oxihemoglobina por oximetria de pulso (SpO 2 ) de repouso inferior a 88% sem suplementação de oxigênio, ou edema agudo de pulmão com indicações clínicas para ventilação mecânica. Além disso, pacientes com indicação clínica para utilização de VNI além da proposta nesse protocolo foram excluídos. Protocolo do estudo Todos os indivíduos foram submetidos a uma avaliação clínica individualizada no dia 1 (D1) de internação pelo cardiologista e pelo fisioterapeuta envolvidos no estudo. Foram realizados testes de função pulmonar (espirometria), coleta de sangue para medida de peptídeo natriurético cerebral (NT-pró-BNP) e proteína C-reativa (PCR), teste de caminhada de seis minutos (TC6M), e medida da pressão inspiratória máxima (PImax). Todos os pacientes receberam tratamento médico padrão 7 e, após testes clínicos e laboratoriais, foram randomizados em três grupos: exercício combinado com a VNI (EX+VNI), exercício com ventilação sham (EX+Sham) e Controle. Optamos por incluir um grupo com ventilação placebo (sham) para testar a hipótese de que somente o exercício EX+Sham ou o exercício combinado com VNI EX+VNI tiveram melhor desempenho que o tratamento convencional (grupo Controle) em pacientes com IC aguda. Ogrupo EX+VNI realizou treinamento aeróbico combinado com VNI uma vez ao dia por 8 dias consecutivos, e o grupo EX+Sham realizou exercício aeróbico com ventilação placebo (sham) uma vez ao dia, também por 8 dias consecutivos. O grupo Controle recebeu somente tratamento clínico e não foi submetido a treinamento aeróbico. No dia 10 (D10), todos os pacientes foram submetidos à mesma avaliação clínica que no D1. Após o protocolo, todos os pacientes continuaram a receber somente tratamento clínico, e foram acompanhados até a alta hospitalar ou transferência para a unidade de terapia intensiva. Protocolo de exercício Os grupos EX+VNI e EX+Sham realizaram exercício aeróbico em cicloergômetro sem carga para pacientes acamados (Cajumoro, Brasil) por 20 minutos ou menos, até o limite de tolerância. Os grupos de exercício foram cegos quanto à pressão aplicada na VNI ou sham. A SpO 2 (Nonin ® Medical, USA) e a frequência cardíaca (FC) foram medidas continuamente com um monitor de frequência cardíaca (Polar ® RS800, Finlândia). A pressão arterial sistólica (PAS) e a pressão arterial diastólica (PAD) foram medidas pelo método auscultatório (esfigmomanômetro UnilecTM, estetoscópio Littmann Quality, EUA) durante o protocolo de exercício, em repouso, a cada dois minutos, e ao final do exercício. Os pacientes foram solicitados a pontuar o grau de dispneia ao final do exercício pela escala categórica de Borg (0-10). 23 468

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