ABC | Volume 110, Nº5, Maio 2018

Artigo Original Ramires et al Prevalência da síndrome metabólica no Brasil Arq Bras Cardiol. 2018; 110(5):455-466 regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, enquanto nas capitais do Norte e Nordeste foi observado um consumo abaixo da média entre a população. 25 É importante destacar que nessas regiões de grandes centros urbanos, a sociedade é cada vez mais induzida por mensagens veiculadas de ofertas de alimentos, dietas e comportamentos ocidentais. 26 Nos últimos anos, no Brasil, as regiões metropolitanas tem apresentado redução no consumo domiciliar de arroz polido, feijão, cereais e leguminosas (queda de 60%, 49% e 25% respectivamente), com concomitante aumento contínuo do consumo de alimentos como: bebidas e infusões (22% e 24%), alimentos preparados e misturas industriais (67%), destacando-se o crescimento em 490% da quantidade adquirida de refrigerante entre os anos de 1974 a 2009, evidenciando uma mudança de comportamento alimentar que nem sempre favorece escolhas saudáveis em regiões desenvolvidas. 27 Nossos resultados mostraram ainda que o nível de escolaridade mais baixo foi associado à prevalência de SM nas mulheres, porém tal associação não foi evidenciada entre a populaçãomasculina. Esse achado é consistente coma literatura internacional, como foi observado em um estudo conduzido na China, onde o nível educacional também apresentou relação inversa com a prevalência de SM estritamente entre as mulheres. 28 Na Coréia, distintamente, foi identificado que homens commenor escolaridade apresentavammenores razões de chances (OR) tanto para SM (OR 0,76, IC 95% 0,60-0,96), quanto para dois de seus componentes isolados: CC elevada (OR 0,73, IC 95% 0,60-0,91) e baixo colesterol HDL (OR 0,73, IC 95% 0,59-0,91), quando comparados aos homens de maior escolaridade. 29 Ainda neste estudo, entre as mulheres socialmente desfavorecidas com menor nível de educação, desempregadas, menor nível de renda e que realizavam trabalhos manuais foi observada uma maior prevalência de SM, assim como destacado em nossos resultados quanto ao nível de educação. 29 Todavia, resultado antagônico foi notado em uma população masculina de alto nível educacional, onde a distribuição de fatores de risco cardiovascular foi mais observada neste estrato populacional. Isso pode ser reflexo do ambiente socioeconômico, que aumenta o risco de SM em um dos gêneros, de maneira mais específica. 30 Em relação a variável situação conjugal, não está claro como o estado civil contribui para a SM. No presente estudo, a situação de viver com companheiro se mostrou associado a SM e emmaior magnitude na populaçãomasculina. Tal constatação foi também evidenciada entre australianos, onde as mulheres que se casaram ganharam mais peso em comparação com as não casadas, após ajuste dos potenciais fatores de confusão. 31 Do mesmo modo, no estudo de Averett et al., 32 o casamento foi associado a um risco aumentado de sobrepeso/obesidade, tanto para homens quanto para mulheres. 32 Ortega et al., 33 em 2011, identificaram que o sexo afeta a relação entre obesidade, fatores de risco cardiometabólicos e estado civil devido a mudanças em fatores comportamentais. 33 Embora a maioria dos estudos tenha relatado que as pessoas casadas tornaram-se mais sedentárias, 34 com reflexo direto no excesso de peso e impacto nas comorbidades desencadeadoras da SM, colaborando com os resultados encontrados neste trabalho, outros estudos mostram resultados diferentes, atribuindo ao tipo de relação conjugal o desfecho da SM. 26,35 Nesse caso, considera-se que relações conjugais positivas podem proteger de situações estressantes, fornecendo tanto benefícios materiais quanto de suporte, enquanto que relações negativas ou a falta de um relacionamento podem aumentar a exposição aos conflitos, com consequente elevação do nível de estresse, 35 fator reconhecidamente associado à SM. 10 Em relação aos aspectos comportamentais, identificamos que a autopercepção de saúde negativa “regular à muito ruim” foi um importante fator associado à SM. A autopercepção de saúde é um indicador global no qual a pessoa considera, além de possíveis doenças que a acometam, o impacto que as mesmas geram no bem-estar físico, social e mental. 32 Na Espanha, contrapondo os nossos resultados, em estudo multicêntrico e observacional realizado com portadores de DM e/ou SM recentemente diagnosticada, 42,2% dos indivíduos acreditavam ter boa ou excelente saúde, representando pouca consciência acerca do risco cardiovascular que apresentavam. 36 Neste trabalho a associação da autopercepção negativa “regular à muito ruim” com a SM chama a atenção, porque pode refletir que a população estudada apresentou consciência de sua condição de saúde, porém permanece situada dentro da faixa de risco para desenvolvimento de complicações metabólicas, supondo que possam existir outros fatores que a impeçam de sair desta condição e que mereçam serem melhor investigados. Quanto à prevalência e à associação da SM com as comorbidades (DCV, AVC e depressão), todas se mostraram em maior frequência entre o sexo feminino comparativamente ao sexo masculino, com exceção da IRC. A associação entre SM e IRC encontrada exclusivamente entre os homens, pode em parte ser justificada pela alta prevalência de hipertensão arterial instalada neste grupo. 19 Nas últimas décadas, tornou-se cada vez mais evidente que o prognóstico de pacientes hipertensos é fortemente afetadopelo comprometimento renal, especialmente em termos de mortalidade e eventos cardiovasculares. 37 Em relação aomaior número de comorbidades associadas à SM entre as mulheres do estudo, pode ser explicado, parcialmente, pela baixa procura dos homens pelos serviços de saúde, o que gera um subdiagnóstico. 2 As DCV constituem a primeira causa de morte no Brasil, 2 devendo ser prioridade de saúde pública, por meio de políticas para sua prevenção e controle. A direção da associação entre DCV e SM foi demonstrada em uma coorte dinamarquesa, em que mulheres idosas com SM apresentaram um risco de 1,7 (IC95% 1,44-2,05) para o desenvolvimento de DCV. 38 Esta correlação também pode ser explicada por Salas et al., 16 que mostraram que adultos obesos, principalmente as mulheres, correm particularmente o risco de desenvolver SM, com implicações significativas para sua saúde, sobretudo DCV e diabetes. Estes resultados destacam a importância da perda de peso para reduzir as morbidades associadas à SM. 16 Outra condição de doença associada à SM foi a depressão, com maior prevalência encontrada entre as mulheres. Do mesmo modo, estudo conduzido na Coréia com indivíduos de meia idade entre 40-64 anos, encontrou elevada prevalência entre as mulheres 11,7%, comparativamente aos 464

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