ABC | Volume 110, Nº5, Maio 2018

Artigo Original Ramires et al Prevalência da síndrome metabólica no Brasil Arq Bras Cardiol. 2018; 110(5):455-466 Resultados A descrição das características sociodemográficas, comportamentais e de comorbidades de 59.402 indivíduos com idade superior a 18 anos, de acordo com a ausência ou presença da SM estão descritas na Tabela 1. Foi identificada elevada frequência de indivíduos fisicamente inativos (98,1%) e 53,8% que apresentavam excesso de peso. Houve um relato predominante de autopercepção de saúde muito boa ou boa (65,9%) e uma frequência expressiva de baixa escolaridade (39,1%) entre os indivíduos. Na Tabela 2 são apresentadas as prevalências de SM, das comorbidades e a carga dos componentes da SM na população brasileira. A obesidade abdominal foi o fator com maior prevalência neste estudo (65,2%, IC99% 64,4-65,9), seguindo-se da PA elevada (40,7%, IC99% 39,6-41,7). Observa-se que em todas as comorbidades, as mulheres apresentaram os resultados mais expressivos, sendo a PA elevada (46,9%, IC99% 45,5-48,3) a única condição em que os homens mostraram maior prevalência. No somatório dos componentes, verifica-se ainda que apenas ~1/4 da população não apresentou qualquer das alterações estudadas (23,8% [IC99% 22,9-24,7]), enquanto que 38,1% (IC99% 37,2‑39,0) dos participantes já apresentavam pelo menos um dos componentes da SM e 29,2% (IC99% 28,3-30,1) conviviam com dois dos fatores considerados. A condição de SM foi estimada em 8,9% (IC99% 8,4-9,5) da população brasileira, com a proporção de mulheres nesta condição (10,3% [IC99% 9,6-11,2]) superando estatisticamente o observado na população masculina (7,5% [IC99% 6,7-8,3]). A Tabela 3 apresenta a prevalência da SM segundo as variáveis de exposição estudadas. Destacam-se maiores prevalências do agravo entre indivíduos com maior idade (≥ 60 anos), menor tempo de escolaridade (≤ 8 anos) e que vivem com companheiro. A SM foi maior entre os indivíduos que residem nas regiões SE/S/CO, fisicamente inativos, com excesso de peso e que consideravam sua saúde precária. Quanto às comorbidades, de forma geral, maiores prevalências de SM foram encontradas entre os indivíduos que autorreferiram diagnóstico médico prévio de IRC, AVC e outras doenças cardiovasculares, em relação aos que afirmaram não apresentar a doença. Além disso, identificamos que, independentemente da característica ou condição considerada como risco, a prevalência de SM foi sempre maior dentre as mulheres. Nas tabelas 4 e 5 estão disponíveis os resultados referentes ao processo de modelagem hierarquizado (modelo hipotético‑causal), distintos para homens e mulheres, sobre os fatores associados à SM. No modelo final para a população feminina, identificamos que a probabilidade de ter SM foi maior dentre os indivíduos nas seguintes situações: idade ≥ 60 anos (RP 3,20 [IC99% 2,76-3,72]), escolaridade ≤ 8 anos (RP 1,46 [IC99% 1,23-1,74]), viver com companheiro (RP 1,27 [IC99% 1,11-1,45]), residir nas regiões SE/S/CO (RP 1,18 [IC99% 1,02-1,38]), autopercepção de saúde regular à muito ruim (RP 2,35 [IC99% 1,99-2,78]), AVC (RP 1,36 [IC99% 1,00‑1,86]), outras DCV (RP 1,29 [IC99% 1,03-1,62]), excesso de peso (RP 2,09 [IC99% 1,79‑2,42]) e depressão (RP 1,31 [IC99% 1,07-1,59]) (Tabela 4). Em relação à população masculina, o modelo final não incluiu as variáveis de escolaridade, cor da pele, outras DVC e AVC, permanecendo a idade ≥ 60 anos (RP 2,60 [IC99% 2,04‑3,31]), viver com companheiro (RP 1,48 [IC99% 1,17-1,88]), residir nas regiões SE/S/CO (RP 1,57 [IC99% 1,28‑1,94]), ter pior (“regular à muito ruim”) autopercepção de saúde (RP 2,59 [IC99% 2,01-3,33]) e apresentar IRC (RP 1,85 [IC99% 2,23-2,76]), excesso de peso (RP 3,58 [IC99% 2,73-4,70]) e depressão (RP 1,41 [IC99% 0,98-2,02]) (Tabela 5). Em relação a variável atividade física, para não comprometer a análise, optamos por não incluí-la no modelo, haja vista a baixa prevalência de indivíduos fisicamente ativos (1,8%), o que resultaria em estimativas pouco precisas, decorrente de grande erro-padrão (Tabela 4 e 5). Além disso, considerando o referencial adotado, tornam-se desnecessárias tais comparações, uma vez que quase a totalidade da população brasileira é caracterizada como fisicamente inativa (98,1%) (Tabela 1). Discussão A SM é um fenômeno multidimensional determinado pela interação de um conjunto de fatores que afeta a qualidade de vida das pessoas. 3 Apesar da existência de estudos sobre doenças crônicas e seus fatores de risco na população brasileira, 15 como é o caso do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto, não se tem até o momento, dados com representatividade nacional da prevalência de SM no país. Assim, o presente estudo avaliou pela primeira vez os fatores associados à SM em uma amostra representativa da população brasileira com idade superior a 18 anos, o que representa um marco na investigação do agravo no Brasil, colaborando na construção de evidências capazes de direcionar estratégias resolutivas de prevenção e controle deste agravo. Nós identificamos que aproximadamente 9% da população brasileira apresentou a condição de SM, de acordo com a definição de harmonização dos consensos. 4 Não obstante, nosso estudo revela dados preocupantes, ao contabilizar que somente 23,8% da população não apresenta nenhum dos componentes da SM, e que 67,3% apresentam entre um e dois componentes para caracterizar este desfecho, o que demonstra elevado número de indivíduos sob o risco de desenvolver a SM propriamente dita. Em relação ao sexo, amaior ocorrência de SM foi encontrada entre a população feminina (10,3%, IC99% 9,6‑11,2), fato que vem sendo amplamente registrado na literatura científica, 16,17 especialmente dentre aquelas com idade > 59 anos, o que pode ser explicado pelas modificações hormonais ocorridas após a menopausa. 17 Nesta fase do ciclo da vida há uma tendência de acúmulo de gordura abdominal, bem como de aumento da densidade das partículas de LDL circulantes na corrente sanguínea, tornando-as mais aterogênicas, condições conhecidamente associadas ao maior risco de DCV. 18 Pode-se ainda destacar o elevado número de morbidades encontrado entre as mulheres deste estudo, que apresentaram maiores prevalências de diabetes, hipercolesterolemia e obesidade abdominal, em relação ao sexo masculino. 458

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