ABC | Volume 110, Nº5, Maio 2018

Artigo Original Ramires et al Prevalência da síndrome metabólica no Brasil Arq Bras Cardiol. 2018; 110(5):455-466 Introdução As modificações ocorridas nos padrões socioeconômicos e culturais das populações, decorrentes da rápida urbanização e do desenvolvimento econômico, resultaram em mudanças significativas nos hábitos de vida dos diferentes grupos populacionais. 1 Essa nova forma de organização da sociedade, associada à transição alimentar e ao envelhecimento populacional, promoveu transformações na maneira de adoecer das pessoas aumentando a morbimortalidade por doenças crônicas não transmissíveis (DCNT). 2 No que concerne especificamente às doenças cardiovasculares (DCV), a presença concomitante de fatores de risco, como hipertensão arterial, hipercolesterolemia, diabetes, resistência insulínica e deposição central de gordura está associada ao aumento de aproximadamente 2,5 vezes no risco de morbimortalidade cardiovascular. 3 Esse complexo agregado de fatores predisponentes das DCV constitui a condição definida como síndrome metabólica (SM). 4 Recente estimativa de SM em nível mundial aponta prevalência entre 20-25% na população adulta. 3 Nos Estados Unidos da América a prevalência de SM foi de 34,7% em 2011-2012, definida pelo critério harmonizado, o qual sintetiza outros critérios de classificação elaborado por diferentes organizações para definição desta condição. 5 Entre cidades da América Latina a prevalência da SM encontrada entre os anos de 2003 e 2005 foi de 21%, definida pelo critério americano do National Cholesterol Education Program Expert Panel (NCEP‑ATPIII), apresentando uma variação de 14% a 27%, segundo os territórios estudados. 6 Já no Brasil, a prevalência foi ainda maior, variando em torno de 30% entre indivíduos com idade de 19 a 64 anos em diferentes regiões do pais. 7 Diante desta situação, o governo brasileiro lançou o Plano de Ações Estratégicas para Enfrentamento das DCNT (2011‑2022), que contempla, dentre outras ações, gerar informações e conhecimentos sobre o processo saúde-doença e seus determinantes sociais para formulação de políticas de saúde no Brasil. 8 Neste sentido, foi concebida a primeira Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) voltada à vigilância de fatores de risco e proteção de doenças crônicas na população brasileira. 9 Nesta perspectiva, a partir dos dados da PNS de 2013, o objetivo deste estudo foi estimar a prevalência da SM e de seus componentes para a população brasileira com idade ≥ 18 anos e sua associação com variáveis sociodemográficas, comportamentais e biológicas. Métodos Desenho e amostra do estudo A PNS é um inquérito transversal com representatividade nacional da população brasileira residente em domicílios particulares realizada entre agosto e dezembro de 2013. A PNS compreendeu um levantamento populacional sobre saúde e seus determinantes realizado no Brasil pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em parceria com o Ministério da Saúde. 9 Oprocessode amostragemfoi organizadopor conglomerados em três estágios, onde a unidade primária de amostragem (UPA) foi composta por setores censitários, a unidade secundária foi o domicílio e a unidade terciária, os moradores com 18 anos ou mais de idade. Dentro de cada estágio, os participantes foram selecionados por meio de amostragem aleatória simples. Foi considerado o peso do domicílio correspondente, a probabilidade de seleção do morador, ajustes de não resposta por sexo e calibração pelos totais populacionais, por sexo e classes de idade estimadas, com o peso de todos os moradores. Uma descrição detalhada da metodologia aplicada para a PNS‑2013 foi publicada anteriormente. 9 Para descrever as condições de saúde da população brasileira, a PNS foi constituída por módulos temáticos que abordaram a percepção individual da saúde e estilo de vida, presença de doenças crônicas, bem como informações sociodemográficas. Para fins deste estudo, foram selecionados os indivíduos que possuíam dados sobre os fatores que compõe a SM, ou seja, diagnóstico médico autorreferido de diabetes mellitus e hipercolesterolemia, além dos valores das medidas de pressão arterial (PA) e circunferência da cintura (CC). Entre os 69.954 domicílios ocupados com morador selecionado para a entrevista na PNS-2013, foram entrevistados 60.202 indivíduos com18 anos oumais de idade, representando uma taxa de resposta dos moradores selecionados de 86%. 9 Desse total foram excluídas 800 gestantes gerando uma amostra final composta por 59.402 indivíduos. A Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) aprovou o projeto da PNS em junho de 2013, sob o parecer n.º 328.159. Todos os entrevistados que concordaram em participar da pesquisa assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. 9 Variável de desfecho Neste estudo, a variável de desfecho SM foi definida de acordo com a proposta de harmonização dos consensos internacionais de cardiologia (IDF/NHLBI/AHA/WHF/IAS/ IASO), caracterizada pela presença de três entre cinco fatores de risco metabólicos. 4 Em nosso trabalho, uma vez que a PNS não disponibilizou dados bioquímicos, a classificação da SM foi realizada considerando a presença de pelo menos três das quatro situações disponíveis no banco de dados: 1) diagnóstico autorreferido de diabetes; 2) valores de PA considerados limítrofes para diagnóstico de Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) (sistólica ≥ 130 mm Hg e/ou diastólica ≥ 85 mmHg); 3) valores de CC acima do ponto de corte estabelecido como limiar de obesidade abdominal para a população da América do Sul (homens ≥ 90 cm e mulheres ≥ 80 cm); e, 4) diagnóstico autorreferido de hipercolesterolemia. A PA foi aferida por uma equipe treinada usando aparelho digital calibrado. Os indivíduos precisavam estar em repouso e foram orientados a esvaziar suas bexigas, não fumarem ou beberem durante o período de 30 minutos anterior à medição e não fazerem qualquer atividade física durante o período de uma hora anterior à medição. As medidas de PA foram feitas com os indivíduos na posição sentada, depois de terem descansado durante pelo menos cinco minutos. Os indivíduos foram instruídos a manterem-se relaxados e apoiados contra o encosto da cadeira, não cruzarem as pernas e deixarem o seu braço esquerdo livre de roupas e apoiado em uma mesa 456

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