ABC | Volume 110, Nº5, Maio 2018

Artigo Original Odozynski et al Gênero e ablação de FA Arq Bras Cardiol. 2018; 110(5):449-454 Introdução Apesar da prevalência de fibrilação atrial (FA) ajustada por idade ser relativamente maior em homens que mulheres, o número absoluto de portadores da arritmia entre os gêneros é semelhante, com a maioria dos casos ocorrendo em pacientes entre 65 e 85 anos, período este em que, proporcionalmente, mais mulheres estão vivas. 1 Estudos populacionais demonstram menores taxas de indicação e realização do tratamento ablativo da FA em mulheres com fibrilação atrial quando comparadas aos homens. 2-5 No entanto, não é claro se isto representa uma discrepância assistencial ou uma diferença real. Partindo‑se do pressuposto de que maiores taxas de complicações e recorrência ocorrem em mulheres comparativamente aos homens, a subutilização da ablação de FA emmulheres, neste caso, poderia ser entendida como uma diferença apropriada e não carência direta na assistência. Estudos prévios avaliando diferenças entre os gêneros quanto à segurança e eficácia da ablação da FA por cateter apresentam resultados contraditórios, sendo escassa a literatura nacional quanto ao tema. 6-13 Neste estudo, avaliamos as características clínicas e desfechos de uma coorte brasileira atual de mulheres submetidas à ablação de FA por cateter comparativamente aos resultados obtidos em homens. Métodos Desenho do estudo e participantes Estudo do tipo coorte de pacientes submetidos ao primeiro procedimento de ablação por cateter de fibrilação atrial paroxística (FAP) refratária a drogas antiarrítmicas com tempo de acompanhamento mínimo por paciente igual a 12 meses. O estudo foi realizado entre 2013 e 2015 em um único centro. As informações foram retiradas dos prontuários dos pacientes por meio de instrumento digital de coleta e indexadas a uma base de dados online (Syscardio®). As características clínicas e procedimentos foram comparados entre cada gênero (H x M). O desfecho primário associado à eficácia foi a ausência de arritmia atrial com duração > 30 segundos durante o período de acompanhamento após o primeiro e único procedimento de ablação. Procedimentos Todos os pacientes foram submetidos ao isolamento circunferencial das veias pulmonares (VPs) por meio de ablação por cateter irrigado com ponta de 3,5 mm sem aferição da força de contato, utilizando energia de radiofrequência com aplicações de até 35 Watts e 43°C por 10-45 segundos e demonstração de bloqueio elétrico de entrada e saída das VPs em relação ao átrio esquerdo ao final do isolamento. Todos os procedimentos foram realizados sob anestesia geral, intubação orotraqueal e monitoramento invasivo da pressão arterial por punção radial ou femoral esquerda aos cuidados de anestesiologista. As punções transeptais foram realizadas com auxílio de Eco intracardíaco, que foi mantido durante todo o procedimento. Aplicações na parede posterior do átrio esquerdo foram monitoradas por meio de termômetro esofágico com sensores múltiplos recobertos (Circa) e interrompidas sempre que houvesse alteração na temperatura esofágica acima de 38°C. Durante todos os procedimentos, realizados com sistema de mapeamento eletro-anatômico baseado em impedância torácica (EnSite Navx – Abbott), foi realizado bolus de heparina IV de 100 mg/kg seguida de infusão contínua para manter um tempo de coagulação ativado entre 350 e 450 seg. Após o procedimento os pacientes permaneceram em uso de drogas antiarrítmicas (propafenona, sotalol ou amiodarona dependendo da preferência do médico assistente) por 1 mês e de anticoagulante por um período mínimo de 3 meses independentemente do CHA2DS2-VASc. Realizado acompanhamento clínico 1, 3, 6 e 12 meses após o procedimento com realização de ECG e no mínimo dois Holters ao longo de todo o seguimento clínico. Na 10 a  semana após a ablação, os pacientes foram encorajados a realizar monitorização eletrocardiográfica continua (Holter) de 5 dias. Qualquer arritmia atrial maior que 30 segundos de duração documentada após 1 mês de blanking period indicou recorrência da arritmia. 14 A severidade dos sintomas antes da ablação e durante as eventuais recorrências foi caracterizada pelo escore CCS-SAF ( Canadian Cardiovascular Society Severity of Atrial Fibrillation ). 15 Análise estatística As características clínicas e procedimentos foram comparados entre cada gênero (H x M). As taxas de recorrência após um único procedimento, assim como as complicações também foram comparadas entre os grupos. Adotou-se uma amostra por conveniência (não-probabilística) durante o tempo de estudo, respeitando-se os critérios de inclusão/exclusão e tempo de seguimento. Variáveis contínuas foram descritas como média e desvio padrão e comparadas utilizando teste-T de Student não‑pareado (bicaudal), respeitando-se os critérios de normalidade pelo teste de Shapiro-Wilk. Variáveis categóricas foram descritas por número absoluto e porcentagens em relação à amostra total, sendo comparadas utilizando-se o teste de χ ² ou Exato de Fischer. O nível de significância estatística adotado foi de 5%. Foi utilizado curva de Kaplan-Meier para evidenciar as taxas de recorrência ao longo do tempo de seguimento e o teste de Log-Rank para avaliar diferença entre os grupos (H x M). A análise estatística foi realizada utilizando-se IBMSPSS Statistics Editor software, versão 22.0. Resultados Pacientes Foram incluídos na análise do estudo 225 pacientes submetidos à ablação de FA: 161 (71%) homens e 64 (29%) mulheres. Em relação ao tempo de acompanhamento, não houve diferença entre homens e mulheres. A tabela 1 resume as características clínicas dos homens e mulheres submetidos à ablação de FA paroxística durante o período estudado. Em relação à média de idades, mulheres submetidas à ablação por cateter eram mais velhas que os homens (57 ± 11 H x 62 ± 9 M p < 0,1) porém não houve diferença entre os 450

RkJQdWJsaXNoZXIy MjM4Mjg=