ABC | Volume 110, Nº5, Maio 2018

Artigo Original Navarro et al Síndrome metabólica em homens vegetarianos e onívoros Arq Bras Cardiol. 2018; 110(5):430-437 Introdução Cresce o número de indivíduos que consome uma dieta vegetariana (VEG) ou à base de vegetais, havendo evidência de que tal hábito acha-se associado a uma menor prevalência dos fatores de risco para doenças cardiovasculares (DCV). 1-5 Poucos estudos na literatura avaliaram a associação entre dieta VEG e menor risco de doença arterial coronariana (DAC), 5,6 usando o Escore de Risco de Framingham (EF), um algoritmo para avaliar o risco de DAC em curto prazo (< 10 anos). 7 Estudos recentes mostraram uma menor prevalência de síndrome metabólica (SM) entre indivíduos VEG, 8,9 a despeito das evidências inconclusivas de outros. 10-14 O único estudo da literatura científica que avaliou a relação em uma população latino-americana não demonstrou associação. 5 A importância da SM está no fato de que cerca de um em quatro adultos nos Estados Unidos tem SM, considerada fator de risco para doença aterosclerótica cardiovascular. 15 Ademais, 20-25% dos adultos no mundo têm SM, que dobra o risco de infarto e triplica o risco de acidente vascular encefálico, 16-18 além de elevar o risco de morte na população geral. 19 O objetivo deste estudo observacional foi investigar a associação entre o tipo de dieta e a prevalência de SM avaliada em homens VEG e onívoros (ONI) aparentemente saudáveis. Nossa hipótese é que homens VEG têm melhores indicadores para essa condição do que homens ONI. Métodos No estudo transversal recentemente publicado Carotid Atherosclerosis and Arterial Stiffness in Vegetarian and Omnivorous Subjects (CARVOS), 20 745 adultos voluntários foram inicialmente recrutados em São Paulo através de atividades sociais e da Internet. Os participantes completaram questionários sobre história médica pregressa, história familiar, preferências dietéticas e dados pessoais. Os critérios de exclusão consistiram em: 1) sexo feminino; 2) histórico de diabetes; 3) histórico de dislipidemia; 4) histórico de DCV ou doença cerebrovascular; 5) histórico de hipertensão ou uso de anti-hipertensivos; e 6) tabagismo. Todos que se autodeclararam “fumantes” ou “fumantes ocasionais” na entrevista ou que tinham parado de fumar no último mês antes da entrevista foram considerados fumantes. Embora os critérios de exclusão do projeto de pesquisa fossem relacionados aos componentes da SM, eram a referência do diagnóstico prévio, observando-se que vários indivíduos apresentaram SM, sendo possível desenvolver o presente estudo que visou comparar a porcentagem de indivíduos com SM nos dois grupos conforme o tipo de dieta. Participantes saudáveis ≥ 35 anos foram divididos em dois grupos – VEG e ONI – de acordo com seus padrões dietéticos. Homens VEG foram definidos como aqueles que consumissem exclusivamente uma dieta vegetariana sem carne, peixe e ave por pelo menos quatro anos. Esses homens podiam ser lacto-ovo-vegetarianos (consumo de ovos, leite e produtos lácteos), lacto-vegetarianos (consumo de leite e produtos lácteos) ou veganos (não consumiam ovos, nem leite, nem produtos lácteos). Os homens ONI pareados foram definidos como aqueles que consumissem pelo menos quatro porções por semana de qualquer tipo de carne. De junho de 2013 a janeiro de 2014, após aplicar critérios de inclusão e exclusão, 88 homens aparentemente saudáveis foram arrolados no estudo (44 VEG e 44 ONI). Todos os 88 indivíduos foram investigados quanto ao seu estado de saúde com questionários sobre o nível educacional, dados pessoais, história médica pregressa, tabagismo e consumo usual de álcool (sim ou não). Pressão arterial sistólica (PAS) e pressão arterial diastólica (PAD) forammedidas duas vezes no braço direito após repouso de 10 minutos na posição supina, usando esfigmomanômetro digital calibrado. Os indivíduos foram entrevistados, e usou-se a média de dois recordatórios alimentares de 24 horas (um de dia útil e um de final de semana) para estimar o consumo diário de diferentes nutrientes. A base de dados para a composição de alimentos brasileiros foi usada para calcular a ingestão diária de energia e nutrientes. 21 Os participantes foram pesados em uma balança de plataforma de 150 kg (Filizola ® ) com divisão de 100 gramas, posicionados no centro, em pé e descalços, vestindo o mínimo de roupas e acessórios. Para medir a altura, usou-se um estadiômetro portátil posicionado em local apropriado, estando o participante em pé, descalço e com os pés juntos, tendo a parte posterior da cabeça, ombros, nádegas, panturrilhas e tornozelos encostados na parede, com a cabeça no plano horizontal de Frankfurt (linha imaginária que vai do canal auditivo externo até o ponto mais baixo da margem orbitária). 22 Calculou-se o índice de massa corporal (IMC) dividindo-se o peso corporal (kg) pelo quadrado da altura (m). Para medir a circunferência abdominal (CA), o indivíduo permaneceu em pé, com os braços relaxados ao lado do corpo, e a região a ser medida descoberta. Utilizou-se uma fita métrica no ponto médio entre a última costela e a crista ilíaca, com o abdome relaxado, ao final de uma expiração. 23 Todas as medidas foram tomadas três vezes, usando-se o valor médio para análise. Após jejum noturno de 10-12 horas, amostras de sangue foram colhidas da veia antecubital. Os lípides plasmáticos, incluindo triglicérides (TG), colesterol total (CT) e colesterol da lipoproteína de alta densidade (HDL-c), foram dosados pelos métodos enzimáticos com um analisador químico multicanal automático (Siemens Healthcare, Newark, EUA) no laboratório central do InCor. O colesterol da lipoproteína de baixa densidade (LDL-c) foi calculado com a fórmula de Friedewald. 24 Determinou-se a hemoglobina glicada (HbA1c) pelo método imunoturbidimétrico certificado pelo NGSP - National Glycohemoglobin Standardization Program , usando-se o kit Flex (Siemens Healthcare, Newark, EUA). Para medir a apolipoproteína b (Apo b) e a glicemia de jejum (GJ), amostras de sangue foram centrifugadas a 3000 rpm por 15 minutos em até 60 minutos após a coleta, e armazenadas a −70°C até a análise. Determinou-se a GJ pelo método da glicose oxidase, usando o sistema Dimension RXL (Siemens Healthcare, Newark, NJ, EUA) com técnicas laboratoriais padronizadas. Avaliou‑se o controle de qualidade diariamente em todas as determinações. 431

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