ABC | Volume 110, Nº5, Maio 2018

Artigo Original Salmazo et al Frequência de aterosclerose subclínica em brasileiros infectados pelo HIV Arq Bras Cardiol. 2018; 110(5):402-410 Introdução Ao final de 2012, havia cerca de 35 milhões de indivíduos HIV positivos no mundo. Até junho de 2012, 656.701 casos haviam sido identificados no Brasil desde a detecção do primeiro em São Paulo em 1980, incluindo os 253.706 casos letais entre 1980 e 2011. 1,2 Emmeados da década de 1990, as taxas aumentaram, mas a situação atual indica uma epidemia estável, 2 com sinais de redução na taxa demortalidade na última década. 1 Os mais importantes fatores que contribuíram para isso foram a introdução da terapia antirretroviral de alta eficácia (HAART) e o fácil acesso a ela. Entretanto, com o passar dos anos, observou-se que a HAART pode alterar o perfil lipídico dos pacientes, acelerando a aterosclerose. 3-8 A despeito disso, a doença cardiovascular (DCV) é a principal causa de morte no mundo (Organização Mundial da Saúde, 2013), além de ser a principal causa de morte evitável. Há indicação de um possível efeito direto das partículas proteicas virais ou da liberação de proteínas pelas células infectadas nos receptores do endotélio vascular, favorecendo, assim, a presença de pró-coagulantes, ativação plaquetária, diminuição da produção de óxido nítrico a partir da destruição de linfócitos T CD4 (células CD4 + ), e produção de citocinas inflamatórias. 4,9,10 Publicações recentes indicaram que o efeito viral no endotélio vascular pode contribuir para reduzir o número de células endoteliais primárias, levando a disfunção endotelial e aterosclerose. 11 Entretanto, não há consenso quanto à relação entre HAART e aterosclerose, o que pode ser atribuído à complexidade dos fatores envolvidos. 4-6,8,10,11 Portanto, novas estratégias foram sugeridas para prevenir eventos cardiovasculares, incluindo a pesquisa de aterosclerose subclínica. 6,12-16 A espessura médio-intimal carotídea (EMIC) e a presença de placa aterosclerótica (PL) na carótida foram associadas com o escore de risco de Framingham (ERF) para doença coronariana; indivíduos com elevação desse índice apresentam maior risco de desenvolver doença cardiovascular (DCV). 17-24 Outro marcador de DCV é a proteína C reativa ultrassensível (PCR-us). Em pacientes HIV positivos, sabe-se que a PCR-us, embora com baixa sensibilidade, é um possível marcador de progressão de doença e aterosclerose. 25-28 A rigidez arterial é avaliada através de velocidade de onda de pulso (VOP), augmentation index (AIx) e pressão na aorta ascendente (PAA), estudados como índices promissores para o diagnóstico de disfunção endotelial precoce. 29-32 Poucas publicações avaliaram esses índices em pacientes HIV positivos, sendo limitado o número de casos. 16,29-32 O presente estudo teve os seguintes objetivos: 1- identificar a frequência de aterosclerose subclínica em pacientes HIV positivos, comparando-a com a de controles; 2- associar o diagnóstico de aterosclerose subclínica com a carga viral, níveis de CD4 e tratamento antirretroviral empacientes HIV positivos; 3- associar a presença de aterosclerose carotídea com fatores de risco cardiovascular e ERF em pacientes HIV positivos. Métodos Todos os participantes assinaram o termo de consentimento livre e informado, tendo o protocolo do estudo sido aprovado pelo Comitê de Ética da universidade. Trata-se de estudo prospectivo transversal caso-controle com pacientes consecutivamente selecionados. Todos os pacientes infectados pelo HIV do ambulatório de Doenças Infecciosas foram incluídos no estudo. Os critérios de exclusão foram evidência de aterosclerose (entrevista, revisão de prontuário médico e exame físico), idade inferior a 18 anos, gravidez, evidência de outras causas de imunossupressão e falha na obtenção de dados por dificuldades técnicas. Controles saudáveis foram prospectivamente incluídos. Coleta de dados Os pacientes foram convidados a participar do estudo após exposição do projeto na sala de espera em consulta de rotina. Aqueles que aceitaram foram encaminhados para uma clínica onde receberammais informação, tiveram suas dúvidas esclarecidas e foram submetidos a entrevista guiada através de questionário estruturado, exame físico e avaliação das carótidas por ultrassonografia, seguindo-se coleta de amostra de sangue para exames laboratoriais. Informação sobre HAART, tempo desde o diagnóstico e tratamento, carga viral de RNA-HIV e contagem de CD4 + e CD8 + foram obtidas a partir da revisão dos prontuários médicos. Calculou-se o risco cardiovascular pelo ERF. 12 Ultrassonografia das carótidas A ultrassonografia das carótidas foi realizada por um único especialista adequadamente treinado, usando o equipamento Vivid I ou Vivid S6 (General Electric Healthcare, EUA) com transdutor linear de 7.0 MHz e sistema de aquisição de imagem. As imagens foram obtidas e analisadas de acordo com as recomendações do consenso da Sociedade Americana de Ecocardiografia e do Consenso de Mannheim sobre EMIC. 21,22 As imagens da EMIC foram obtidas por método automático usando um programa desenvolvido pela GE para determinar a espessura média das artérias carótidas esquerda e direita. Definiu-se PL como uma estrutura focal que invade a luz arterial em pelo menos 0,5 mm, ou 50% da EMIC circunjacente, ou espessura carotídea > 1,5 mm. 21 Rigidez arterial Os índices de rigidez arterial (VOP, AIx e PAA) foram obtidos pelo mesmo operador experiente usando equipamento do sistema Sphygmocor CPV (AtCor Medical, Austrália) e conforme as recomendações vigentes. 29 Exames laboratoriais Uma amostra de sangue após jejum de 12 horas foi obtida de todos os pacientes para analisar PCR-us, glicemia, albumina, hemograma completo, ureia, creatinina, colesterol total (CT), colesterol da lipoproteína de alta densidade (HDL-c) e triglicérides (TGL). Estimou-se o colesterol da lipoproteína de baixa densidade (LDL-c) através da fórmula de Friedewald para níveis de TGL inferiores a 400 mg/dL. 7 Análise estatística Toda a análise estatística foi realizada usando o programa SAS/STAT (SAS Institute Inc., Cary, North Carolina, EUA). 403

RkJQdWJsaXNoZXIy MjM4Mjg=