ABC | Volume 110, Nº4, Abril 2018

Minieditorial Treinamento Intervalado de Alta Intensidade Pós-Infarto Agudo do Miocárdio Recente: O Rato Parece Apto, mas e o Ser Humano? High-Intensity Interval Training for Early Post-Acute Myocardial Infarction – A Promising Approach for Rats, but what about Human Beings? Ricardo Stein Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS - Brasil Correspondência: Ricardo Stein • Serviço de Fisiatria, Térreo - Rua Ramiro Barcelos, 2350. CEP 90035-903 Porto Alegre, RS - Brasil E-mail: rstein@cardiol.br Palavras-chave SíndromeCoronarianaAguda; ReabilitaçãoCardíaca; Exercício DOI: 10.5935/abc.20180068 As síndromes coronárias agudas (SCA) e, em especial, o infarto agudo do miocárdio (IAM) matam e/ou incapacitam um número elevado de pessoas no mundo todo. Apesar de nem todo paciente pós-IAM cursar com disfunção ventricular, a insuficiência cardíaca pós-evento ainda apresenta prevalência elevada 1,2 sendo um problema de saúde pública. Um vasto arsenal medicamentoso, comumente associado a procedimentos de revascularização, compõe a base do tratamento pós-SCA, mas diferentes estratégias não farmacológicas têm se mostrado úteis. Nesse particular, o treinamento físico é indicado, 3 e os programas de reabilitação cardíaca comumente mesclam o treinamento aeróbico com o resistido, ambos aliados aos exercícios de flexibilidade/alongamento. No entanto, não existe “receita de bolo” para prescrição do exercício após um evento coronário agudo. É minha opinião que o uso do receituário do cardiologista deve contemplar o exercício como o faz com um remédio. Em outras palavras, o treinamento físico e o uso das drogas de ação cardiovascular devem ser prescritos levando em consideração diferentes aspectos, tais como dose, intervalo, intensidade e até mesmo potenciais efeitos colaterais. No que diz respeito ao treinamento físico , um verdadeiro “boom” de diferentes modelos vêm sendo aplicados à saúde. Pilates, Tai Chi Chuan, treinamento funcional, crossfit, treinamento intervalado de alta intensidade (TIAI), entre outros, pululam nas academias e centros físicos do país, sendo aplicados primeiramente para pessoas aparentemente saudáveis. Com o passar do tempo, alguns experimentos começaram a ser realizados em animais de laboratório e em indivíduos comdoenças cardiovasculares. 4-7 O TIAI (do inglês “HIIT”) é um método inicialmente proposto para patinadores olímpicos japoneses por Izumi Tabata. Hoje emdia, é predominantemente realizado com intervalos de uma quatrominutos demaior intensidade emcarga submáxima elevada, alternadamente com intervalos de baixa a moderada intensidade. Ensaios clínicos randomizados com pequeno tamanho amostral sugerem uma possível superioridade do método em aumentar o consumo de oxigênio de pico (VO 2 pico) quando comparado ao treinamento contínuo convencional. Por suas peculiaridades e resultados, virou uma “febre” mundo afora, mas a literatura internacional continua sendo limitada em relação ao seu impacto em pacientes cardiopatas isquêmicos e, particularmente, pós-IAM. 4,8,9 Neste número dos Arquivos Brasileiros de Cardiologia, Winter et al., 10 apresentam informações sobre a repercussão do TIAI sobre a capacidade funcional e a função ventricular de 29 ratos Wistar após IAM. No vigésimo primeiro dia depois do evento, uma amostra foi randomizada, sendo 10 controles, 9 para treinamento contínuo e 10 para TIAI. É importante salientar que todos os ratos apresentavam fração de ejeção maior ou igual do que 50%, ou seja, semdisfunção ventricular. Primordialmente, os autores não encontraramdiferença ecocardiográfica intragrupos e intergrupos pré- e pós-treinamento nos ratos randomizados para treinamento contínuo, assim como para o TIAI. Eles sugerem que os dois métodos são capazes de produzir efeito de treinamento (aumento na capacidade funcional) sem alterar a função ventricular (remodelamento). A partir dessa informação a seguinte pergunta poderia ser feita: seres humanos pós-IAM recente e sem disfunção ventricular podem ser expostos a esse tipo de treinamento? Em um estudo clássico, Wisloff et al., 5 avaliaram três grupos de pacientes idosos com insuficiência cardíaca e fração de ejeção reduzida (ICFER), estáveis clinicamente, todos pós-IAM há mais de um ano. Os sujeitos foram randomizados para grupo controle, treinamento contínuo moderado (TCM) e TIAI. 5 Àqueles arrolados para o TIAI apresentaram melhora no VO 2 pico, no remodelamento do ventrículo esquerdo, reversão da disfunção endotelial e redução do peptídeo natriurético cerebral (BNP) quando comparados ao TCM. Ainda, uma metanálise composta de 160 pacientes mostrou que o treinamento intervalado (não necessariamente de alta intensidade) aumentou o VO 2 pico em pacientes com ICFER. 11 Da mesma forma, em uma metanálise com 230 pacientes, Elliott et al., 12 relataram que o treinamento intervalado parece promover aumento no VO 2 pico em pacientes com doença arterial coronária estável. 12 Ao longo dos últimos anos, diferentes estratégias emergiram como opções interessantes a serem utilizadas nos programas de reabilitação cardíaca pós‑IAM recente, sendo o Tai Chi Chuan um exemplo 13 Em última análise, toda e qualquer intervenção deve ser usada para auxiliar o paciente em sua recuperação, reduzindo a morbidade, aumentando a funcionalidade e, quando possível, prolongado a sobrevida. Em relação à aplicabilidade do TIAI em pacientes estáveis no cenário pós-IAM recente, especula-se que o método seja capaz de 381

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