ABC | Volume 110, Nº4, Abril 2018

Artigo Original Silva et al Hipotensão postural: análise espectral Arq Bras Cardiol. 2018; 110(4):303-311 Introdução Hipotensão ortostática (HO) ou postural clássica é definida como a queda sustentada de pelo menos 20 mmHg na pressão arterial sistólica e/ou a queda de pelo menos 10 mmHg na diastólica dentro de três minutos ao assumir a posição ortostática. 1,2 A HO tem sido associada a quedas, pré‑síncope, síncope, comprometimento funcional dos idosos, e a eventos cardiovasculares, com aumento da mortalidade. 3-5 Sua prevalência é de 6 a 35%, 4 atingindo 41% naqueles com pelo menos 80 anos de idade. 6 Com o avançar da idade, há alterações na regulação autonômica da frequência cardíaca (FC) e dos níveis pressóricos. Mulheres de meia idade apresentam uma dominância parassimpática e homens apresentam dominância simpática, porém estas diferenças desaparecem após os 50 anos, com predomínio do simpático. 7 Os idosos também apresentam um aumento dos níveis plasmáticos de noreprinefrina e diminuição da sensibilidade dos receptores beta-adrenérgicos. Há redução da resposta vasomotora mediada pelos receptores alfa, com menor capacitância venosa dos membros inferiores, além da redução da resposta do barorreflexo, também atribuída à perda da elasticidade com rigidez das artérias. 8,9 Toda essa complexa alteração da regulação resulta em disfunção autonômica e pode causar HO. Para análise do sistema nervoso autônomo, o qual está implicado na fisiopatologia da HO, pode ser feita a mensuração da variabilidade da FC (VFC) pelo sistema Holter, 10 método não invasivo e de baixo custo. Estudos sobre o sistema nervoso autônomo, como o estudo de barorreflexo utilizando o teste de inclinação, foram realizados em idosos hipertensos e normotensos, sem comprometimento cognitivo, em comparação à população de jovens. Esses estudos incluíram até 80 idosos, com 64 entre os hipertensos. 11-13 O estudo maior, com população de 362 voluntários, incluiu 38 homens e 51 mulheres entre 57 e 88 anos de idade, 13 mas os autores não especificaram o exato número de idosos. À vista disso, este estudo tem como objetivos verificar o comportamento da FC e de sua variabilidade, por meio da análise espectral, com a mudança de postura em idosos, e analisar os preditores de HO. Métodos Trata-se de um estudo observacional, prospectivo e transversal. A população foi constituída por 105 pacientes, com idade igual ou superior a 60 anos, incluídos entre fevereiro de 2013 a agosto de 2014, provenientes do ambulatório. Foram excluídos pacientes com demência, doenças neurológicas associadas à disfunção autonômica, institucionalizados, pacientes em ritmo de fibrilação atrial persistente ou permanente, em ritmo de marca-passo artificial e em uso de fármaco antiarrítmico das classes I, III e IV da classificação de Vaughan Williams, além de digoxina. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da instituição e todos pacientes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Para planejamento amostral, foram considerados os dados de teste monocaudal, com nível de significância de 5% e poder de teste de 90%, número de controles por caso de 2:1 e proporção de HO de 30%, e com pareamento por idade entre os grupos com e sem HO. Foram constituídos dois grupos; o grupo-caso, composto de 39 pacientes com HO, e o grupo-controle, composto de 66 pacientes sem HO. Os pacientes foram submetidos à avaliação clínica, a exames de patologia clínica, ao eletrocardiograma de 12 derivações, e à mensuração da pressão arterial (PA) na posição supina, no 5º min de repouso, e ao 3º min do ortostatismo ou antes, caso apresentassem sintomas de HO (segundo condições estabelecidas pela literatura 2 ), sob monitoramento pelo sistema Holter. As medidas foram realizadas em uma sala climatizada, no período da tarde, com intervalo de pelo menos duas horas após o almoço, excluindo, assim, hipotensão pós‑prandial. O monitoramento pelo sistema Holter foi feito por meio de multicardiógrafo digital marca Cardioflash, modelo com três canais (V1 e V5 modificados e DIII), versão 1.0, na posição supina e em ortostatismo, durante o período de 15 e 10 minutos, respectivamente, para análise da VFC no domínio da frequência pela transformação de Fourier. Foram calculadas as medidas dos componentes de alta frequência (HF), que indica a atividade parassimpática, e de baixa frequência (LF), que indica, principalmente, a atividade simpática, e a relação LF/HF. 10 Tal avaliação foi feita após adequada edição manual dos registros, com eliminação dos artefatos e correção das arritmias. As medidas foram obtidas durante cinco minutos, no 10º min da posição supina e no 5º min da posição ortostática. Os resultados da análise espectral foram expressos em ms 2 . Foram também calculados os escores de risco cardiovascular de Framingham 14 e de PROCAM, 15 a partir de dados clínicos e de exames laboratoriais. Estes últimos incluíram as dosagens plasmáticas do colesterol e suas frações, dos triglicerídeos, além da glicemia de jejum. Análise estatística Para análise dos dados, foi utilizado o programa International Business Machines (IBM) Statistical Package for Social Sciences (SPSS) Statistics 19. Os resultados foram expressos em números e proporção, para as variáveis categóricas, e em medidas de tendência central (média e mediana) e de dispersão, para variáveis contínuas. O teste do qui-quadrado e o de Fisher, quando apropriado, foram utilizados para estudar possíveis associações entre variáveis categóricas. Não foi feito teste para verificar a normalidade dos dados. Para comparação entre variáveis contínuas, foi utilizado o teste de Mann‑Whitney. Com o objetivo de verificar a correlação entre variáveis categóricas, foi utilizado o coeficiente de Spearman. O teste de Wilcoxon foi empregado para comparar os dois períodos dos componentes da análise espectral da VFC (posição supina e em ortostatismo). A análise multivariada por stepwise foi utilizada para verificar as variáveis preditoras de HO, considerando-se as variáveis que na análise univariada apresentaram valor de p ≤ 0,10. Foi feita análise da curva de operação característica para a variável estável resposta postural. O nível de significância estatística adotado foi de 5%. 304

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