ABC | Volume 110, Nº4, Abril 2018

Editorial Ablação de Fibrilação Atrial por Cateter em Pacientes com Insuficiência Cardíaca Catheter Ablation for Atrial Fibrillation in Patients with Heart Failure Mauricio Scanavacca e Edimar Alcides Bocchi Instituto do Coração (InCor), Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP - Brasil Correspondência: Mauricio Scanavacca • Unidade de Arritmias Cardíacas do Incor-HC-FMUSP Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44, CEP 05403-000, São Paulo, SP - Brasil E-mail: mauricio.scanavacca@gmail.com Palavras-chave Insuficiência Cardíaca, Fibrilação Atrial, Ablação por Cateter / tendências, Remodelamento Atrial, Amiodarona DOI: 10.5935/abc.20180066 Nos últimos anos, a fibrilação atrial (FA) e a insuficiência cardíaca (IC) têm sido as duas principais síndromes epidêmicas em cardiologia, e frequentemente coexistem. 1 A IC aumenta valores médios da pressão atrial direita e esquerda, promovendo sua dilatação progressiva. Esse remodelamento eletroanatômico predispõe à fibrose atrial e à heterogeneidade elétrica, e aumenta o desenvolvimento de ritmo ectópico, induzindo FA. 2 Um novo episódio de FA, por sua vez, induz a perda de contração atrial, provoca um aumento na frequência cardíaca e causa uma importante irregularidade nas contrações ventriculares, diminuindo a capacidade de bombeamento do coração. Portanto, 50% dos pacientes com IC congestiva de início recente apresentam FA, e até um terço dos pacientes com FA de início recente apresentam IC congestiva. 2 O estudo Framingham mostrou um aumento sigificativo da mortalidade no pacientes com FA que desenvolveram IC, assim como naqueles com IC que desenvolveram um novo episódio de FA. 3 Portanto, existe um fundamento biológico para a prevenção e tratamento da FA associada à IC. Os alvos seriam o controle ventricular, em especial o controle do ritmo cardíaco. Estudos farmacológicos falharam em demonstrar benefícios clínicos na manutenção de ritmo sinusal comparado ao controle da frequência cardíaca em pacientes com função ventricular normal e anormal. 4-6 No estudo AFFIRM, a estratégia de controle do ritmo cardíaco no manejo da FA não ofereceu melhora na sobrevida em comparação à estratégia de controle da frequência cardíaca, e os pacientes apresentaram maior taxa de internação hospitalar. 4 Uma possível explicação para esse fato são os efeitos adversos dos medicamentos antiarrítmicos. Em pacientes com disfunção ventricular esquerda, o uso de drogas antiarrítmicas recomendadas para essa condição, tais como dofetilide e amidoarona, também não mostrou nenhum benefício quanto aos desfechos analisados. 5,6 A ablação por cateter para o tratamento de FA surgiu como a estratégia mais eficaz para manter o ritmo sinusal em pacientes com FA paroxística e FA persistente, e tem sido utilizada em todo o mundo. 7,8 Contudo, existem poucos estudos investigando desfechos como redução de mortalidade em pacientes com IC com ablação por cateter. O estudo “ A randomized controlled trial of catheter ablation versus medical treatment of atrial fibrillation in heart failure (the CAMTAF trial ” demonstrou melhora na fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) com ablação em pacientes com FA persistente. 9 Outras vantagens foram observadas no estudo “ Ablation versus Amiodarone for Treatment of Atrial Fibrillation in Patients with Congestive Heart Failure and an Implanted ICD (The AATAC) trial ”. Di Biase et al., 10 mostraram superioridade da ablação em comparação à amiodarona na manutenção do ritmo sinusal, melhora nas taxas de sobrevida e diminuição da taxa de internação por IC. Mais recentemente, resultados animadores surgiram do estudo “ Catheter ablation for atrial fibrillation with heart failure (Castle-AF) trial ”. Marrouche et al confirmaram as observações do estudo AATAC, mostrando que a ablação FA por cateter reduz significativamente a mortalidade nos pacientes com FA, em comparação à terapia medicamentosa. 11 CASTLE-AF é um estudo multicêntrico, conduzido de janeiro de 2008 a janeiro de 2016, envolvendo um total de 33 localidades na Europa e Estados Unidos. Nesse estudo, 263 pacientes comFA paroxística e FA persistente, sintomáticos, foram aleatoriamente alocados para se submeterem à ablação da FA por cateter (179) ou ao tratamento medicamentoso (184), utilizando-se estratégias de controle da frequência e de controle do ritmo. Todos os pacientes eram classificados em classe funcional II, III ou IV segundo classificação da New York Heart Association (NYHA), apresentavam FEVE menor ou igual a 35%, e implante de desfibrilador. O principal desfecho composto e consistiu em morte por todas as causas e hospitalização por IC. Os resultados finais foram obtidos após um acompanhamento médio de 37,8 meses e mostraram superioridade da ablação por cateter em comparação ao uso de medicamentos. No grupo ablação, 63% dos pacientes estavam em ritmo sinusal aos 60 meses, versus 22% no grupo medicamentos. O desfecho composto ocorreu em 51 (28,5%) pacientes do grupo ablação e em 82 (44,6%) pacientes do grupo medicamentos (HR = 0,62; p = 0,007). Houve uma redução significativa de morte por todas as causas no grupo ablação (13,4% vs. 25,0%), HR = 0,53, p = 0,01 e de morte por causas cardiovasculares (11,2% vs. 22,3%); HR = 0,49; p = 0,009. Além disso, os pacientes submetidos à ablação por cateter apresentaram menor taxa de hospitalização por IC (20,7%) em comparação à terapia medicamentosa (35,9%), HR = 0,56, p = 0,004. Além disso, a ablação por cateter aumentou a distância percorrida em 6 minutos, e melhorou a FEVE (8%). 300

RkJQdWJsaXNoZXIy MjM4Mjg=