ABC | Volume 110, Nº2, Fevereiro 2018

Artigo Original Rabelo et al Presença e Extensão da Fibrose Miocárdica na Forma Indeterminada da Doença de Chagas Arq Bras Cardiol. 2018; 110(2):124-131 de inversão de 150 a 300 ms, largura de banda de 31,25 kHz, 2 NEX (número de excitações). A técnica de realce tardio foi usada para investigar a presença de fibrose miocárdica, a qual foi estimada por um método qualitativo (visual), pela presença ou ausência de realce tardio, localização e padrão apresentados; e de modo quantitativo, em valores percentuais em relação à massa total domiocárdio. Todas as análises foram realizadas com o programa Siemens Argus (Simens AG, Munique, Alemanha). Análise estatística Os dados categóricos foram expressos em números (percentagens, intervalo de confiança de 95% — IC95%), e os dados contínuos foram expressos como média ± desvio padrão (DP) ou mediana e intervalo interquartil (IIQ). Determinou-se a normalidade pelo teste de Kolmogorov- Smirnov. A comparação das variáveis contínuas com distribuição normal foi realizada pelo teste t de Student não pareado e Anova ( one-way analysis ) . Foi utilizado o método de Bonferroni para comparação post-hoc entre os grupos. O teste exato de Fisher foi utilizado para comparação de proporções. Para análise das variáveis contínuas não normais utilizou-se o teste de Kruskal-Wallis. Regressão linear simples foi usada nas associações entre massa fibrótica e fração de ejeção do ventrículo esquerdo. As análises foram realizadas empregando o programa SPSS, versão 20.0 (IBM), e valores de p inferiores a 0,05 (teste bicaudal) foram considerados estatisticamente significativos. Como análise primária a priori , foi descrita frequência e extensão da fibrose miocárdica na forma indeterminada, sendo comparadas as formas cardíacas sem e com disfunção. Como análises secundárias post-hoc , foi testada associação de fibrose com fração de ejeção e escore de Rassi, assim como parâmetros clínicos e laboratoriais foram comparados entre a forma indeterminada e cardíaca sem disfunção. Resultados Características clínicas Foram avaliados 61 indivíduos portadores da doença de Chagas, 56% do sexo feminino, idade média de 58 ± 9 anos, sendo 17 indivíduos na forma indeterminada, 16 na forma cardíaca sem disfunção do ventrículo esquerdo (VE) e 28 na forma cardíaca com disfunção do VE. A maioria dos indivíduos (74%) estava em classe funcional I ou II da NYHA e 4 (6,6%) apresentaram envolvimento gastrintestinal concomitante. 82% eram procedentes da zona urbana, sendo que 50 indivíduos moravam previamente em casa de taipa e 44 informaram contato com o triatomíneo. O relato de familiares dos portadores da doença de Chagas ocorreu em 64%. Oito pacientes utilizarambenzonidazol com finalidade de tratamento etiológico. A prevalência de hipertensão, diabetes mellitus, dislipidemia e tabagismo foi semelhante entre os três grupos. A mediana do escore de Rassi foi 5 (IIQ: 0 – 11), assim distribuídos: 36 indivíduos classificados como de baixo risco (59%), 10 como de risco intermediário (16%) e 15 como alto risco (25%). Demais características clínicas e demográficas estão descritas na Tabela 1 e na Figura 1. Presença e extensão da fibrose miocárdica Realce tardio foi encontrado em 37 dos 58 indivíduos submetidos à RMC (64%). O percentual de área total do miocárdio acometida por fibrose foi de 9,4% (IIQ: 2,4 – 18,4), localizada commaior frequência nos segmentos ínfero-lateral e apical do VE. A localização subnedocárdica e transmural da fibrose foram as mais prevalentes (72%), entretanto, a fibrose transmural ocorre com maior frequência naqueles com disfunção ventricular; p = 0,001. Foi identificada fibrose miocárdica em 6 dos 17 indivíduos na forma indeterminada (41%; IC95%: 23 – 66), proporção semelhante à observada na forma cardíaca sem disfunção do VE (44%; 7 dos 16 indivíduos); p=1,0. Entre os indivíduos com fibrose, a área total do miocárdio acometida foi de 4,1% (IIQ: 2,1 – 10,7) na forma indeterminada versus 2,3% (IIQ: 1 – 5) na forma cardíaca sem disfunção do VE (p = 0,18). Naqueles com disfunção ventricular, o percentual de fibrose foi maior do que nos outros grupos, ocorrendo em 23 dos 25 indivíduos (92%), com área acometida de 15,2 % (IIQ: 7,8 – 25); p < 0,001 (Figura 2). Impacto da fibrose miocárdica A fração de ejeção do VE foi significativamente mais baixa nos indivíduos com realce tardio, quando comparados aos indivíduos sem realce (69 ± 13 versus 48 ± 19%); p < 0,0001. Foi observada correlação negativa entre a extensão da fibrose e fração de ejeção (r = 0,565; p < 0,001), evidenciada uma redução progressiva da fração de ejeção, por análise de regressão linear, a cada incremento percentual da área acometida por fibrose. Essa análise demonstrou com coeficiente de regressão ( β ) de -0,968, o que corresponde à estimativa de redução da fração de ejeção do VE a cada aumento de 1% na área de fibrose (Figura 3). Houve aumento progressivo do quantitativo de fibrose nas diferentes classes do escore de Rassi, quando subdivididos em baixo, intermediário e alto risco. O grupo de alto risco apresentou 13,8% (IIQ: 9 – 19) versus 4,9% (IIQ: 1 – 17) no médio risco versus 0% (IIQ: 0 – 5) no baixo risco (p = 0,003). Não evidenciada diferença de massa fibrótica entre as classes de risco baixo e intermediário (p = 0,19), assim como não houve diferença entre os riscos intermediário e alto (p = 1,0). Gravidade da doença na forma indeterminada versus forma cardíaca sem disfunção do ventrículo esquerdo A fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) nos indivíduos na forma indeterminada foi de 72±8%, semelhante à FEVE nos portadores da forma cardíaca sem disfunção ventricular 67 ± 6%; p = 0,09. Não foram observadas diferenças quando avaliados os níveis de NT‑ProBNP (125 pg/mL versus 159 pg/mL; p = 0,61), PCR ultrassensível (4,6 mg/L versus 2,5 mg/L; p = 0,40), TNF-alfa (0,9 pg/mL versus 1,2 pg/mL; p = 0,56), interleucinas (p = 0,35), IFN‑gama (2,7 pg/mL versus 3,3 pg/mL; p = 0,56) e METs (10 versus 9,4; p = 0,66) alcançado no teste ergométrico e a localização do realce tardio (p = 0,44) quando comparados os portadores da forma indeterminada com aqueles da forma cardíaca sem disfunção (Tabela 2). 126

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