ABC | Volume 110, Nº1, Janeiro 2018

Artigo Original Paixão et al Correlação do ECG com RM na cardiomiopatia hipertrófica Arq Bras Cardiol. 2018; 110(1):52-59 Introdução A cardiomiopatia hipertrófica (CMH) é uma doença genética autossômica dominante, caracterizada por hipertrofia miocárdica na ausência de doenças cardíacas ou sistêmicas. 1 O diagnóstico, em adultos, é definido por espessura diastólica de qualquer parede ventricular maior ou igual a 15 mm medida por exame de imagem. 2 O eletrocardiograma (ECG) é o exame inicial na investigação das cardiopatias. Na CMH, não possui um padrão definido, podendo apresentar sinais de sobrecarga ventricular esquerda, presença de ondas q, alterações no segmento ST, anormalidades das ondas T, ou até ser normal em torno de 6% dos pacientes. 3 Alguns achados eletrocardiográficos específicos podem sugerir a localização da hipertrofia, assim como a presença de fibrose. As ondas T gigantes invertidas (maiores que 10 mm) nas derivações precordiais ou inferolaterais são sugestivas de envolvimento apical. Ondas q profundas nas derivações inferolaterais com ondas T positivas estão associadas à distribuição assimétrica da CMH. Ondas q com duração maior que 40 ms relacionam-se com fibrose. A elevação do segmento ST na parede lateral pode se correlacionar com aneurismas apicais pequenos que estão associados com fibrose. 2 Padrões eletrocardiográficos semelhantes ao de infarto do miocárdio em indivíduos jovens podem ocorrer antes da evidência ecocardiográfica de hipertrofia miocárdica. 4 As alterações eletrocardiográficas podem levar a suspeita de CMH e, em conjunto com a história clínica e outros métodos de imagem, definem o diagnóstico. Tradicionalmente, o ecocardiograma é o método de imagem de escolha para diagnóstico de CMH devido à maior disponibilidade e menor custo. Entretanto, a relação entre as alterações eletrocardiográficas com a morfologia e o grau da espessura não é bem estabelecida, quando comparadas ao ecocardiograma. 5,6 A ressonância magnética cardíaca vem ganhando espaço na propedêutica da CMH, pois é superior na mensuração das espessuras das paredes ventriculares, principalmente em regiões de difícil visualização pelo ecocardiograma, bem como avalia a morfologia e função ventricular. Além disso, a detecção de realce tardio possui valor prognóstico. 2 O presente estudo tem como objetivo correlacionar as variáveis eletrocardiográficas com a localização da hipertrofia miocárdica avaliada pela ressonância cardíaca. Métodos Trata-se de estudo descritivo, com delineamento transversal, que analisou pacientes com diagnóstico de CMH acompanhados no setor de Miocardiopatias do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia (IDPC) submetidos à ressonância magnética cardíaca durante o período de janeiro de 2012 a setembro de 2015. Os critérios de inclusão dos pacientes foram: idade superior a 18 anos, diagnóstico confirmado de CMH pela ressonância magnética realizada no Setor de Imagem do IDPC e ECG interpretável. Por outro lado, os critérios de exclusão foram: menores que 18 anos; fração de ejeção menor que 50% pela ressonância magnética cardíaca; hipertensão arterial resistente; portadores de doença arterial coronária, caracterizada por lesão coronária maior que 50% à angiografia; portadores de doença de Chagas; diagnóstico prévio de amiloidose; endomiocardiofibrose; doença de Fabry; usuários de marca-passo definitivo; e pacientes submetidos à miectomia ou alcoolização septal previamente à realização da ressonância magnética cardíaca. O banco de dados de CMH do setor de Miocardiopatias do IDPC foi analisado. Um total de 112 pacientes preenchiam critérios de inclusão no estudo e seus prontuários médicos arquivados no Serviço de Arquivo Médico e Estatística (SAME) do IDPC foram avaliados. Após revisão dos prontuários, 44 pacientes foram excluídos do estudo. Os ECGs previamente realizados para consulta ambulatorial no Setor de Miocardiopatias foram laudados pelo chefe do Setor de Tele-eletrocardiografia do IDPC, conforme a diretriz brasileira sobre análise e emissão de laudos eletrocardiográficos publicada em 2016. 7 O laudo do ECG contemplou as seguintes variáveis: ritmo, eixo cardíaco do QRS, sobrecargas ventriculares e atriais, bloqueios intraventriculares, presença de strain , tamanho em milímetros da onda R nas derivações DI, V1, V5 e V6 e tamanho em milímetros da onda T nas derivações D1, V5 e V6. A ressonância magnética cardíaca foi analisada pela equipe de radiologia do IDPC quanto à localização da hipertrofia miocárdica, utilizando de base a segmentação proposta pela American Heart Association 8 e quanto à presença de realce tardio, bem como quantificação da massa de fibrose em gramas. Os 17 segmentos foram agrupados em cinco regiões: anterior, inferior, lateral, septal e apical. (Figura 1) Os pacientes com hipertrofia maior que 15 mm em três ou mais regiões foram considerados como concêntricos. (Figura 2) Análise estatística Compararam-se as variáveis eletrocardiográficas descritas anteriormente com a região da hipertrofia, bem como a presença de realce tardio e quantidade de fibrose identificadas na ressonância magnética. A normalidade dos dados foi verificada com o teste de Kolmogorov-Smirnov e decidiu-se utilizar testes não paramétricos para comparação entre os grupos. As medidas resumo mediana e percentis 25 e 75 foram calculadas para as variáveis contínuas e o teste não paramétrico de Kruskal-Wallis foi usado para verificar significância estatística entre os grupos seguido de comparações múltiplas pelo método de Dunn para a comparação dois a dois entre os grupos. Nas variáveis atributo, os resultados foram apresentados em forma de percentuais e frequência. Foi utilizado o teste exato de Fisher-Freeman-Halton para verificar significância estatística entre os grupos. Admitiram-se um nível de significância estatística de 5% e o intervalo de confiança de 95%. Os dados encontrados foram registrados em planilha eletrônica do Microsoft Office Excel, versão 2013e, e, para análise, utilizou-se o pacote estatístico Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) , versão 21.0 para Windows ®. 53

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